O Arquivo Nacional recebeu neste ano uma doação de um acervo significativo sobre a cultura afro-brasileira. Os documentos foram entregues pelo colecionador, jornalista, antropólogo e babalawô Fernandez Portugal Filho, e revelam detalhes da história de terreiros e da religiosidade no Brasil.
O material inclui um livreto de 1974 com os estatutos do Centro Espírita São Jorge, localizado no bairro de Cordovil, no Rio de Janeiro. Tais estatutos são cruciais do ponto de vista historiográfico, pois permitem a pesquisadores compreenderem as dinâmicas sociais, religiosas e políticas de um contexto mais amplo.
Importância histórica dos documentos
Fernandez Portugal Filho explica que o acervo sobre a cultura afro-brasileira inclui itens desde as décadas de 1940 e 1950. Ele destaca a importância de documentos elaborados durante a Ditadura Militar (1964-1985).
“Eles mostram como a umbanda se defendia dentro da estrutura militar, quais elementos eram utilizados para se fortalecer naquele contexto. Isso ajuda a elucidar o comportamento das lideranças da época, inclusive disputas internas e divisões patrimoniais”, disse Fernandez. O material é oriundo do Centro de Estudos e Pesquisas de Cultura Iorubá, fundado por ele em 1977.
O colecionador começou a reunir o material quando iniciou sua jornada no candomblé, migrando posteriormente para a umbanda. Antes de ser aceito pelo Arquivo Nacional, ele tentou, sem sucesso, doar o acervo para outras instituições, como a Biblioteca Nacional e o Museu da Imagem e do Som, que não demonstraram interesse imediato pelo tema.
Detalhes do acervo e acesso
O acervo foi doado em dois lotes. O primeiro lote, doado em 1999, é composto por revistas, recortes de jornais e material bibliográfico sobre temas como arte negra, luta contra discriminação racial e o senador Abdias do Nascimento. Este material está disponível para consulta presencial na instituição, no Rio de Janeiro.
O segundo lote, doado em 2025, foca em documentos textuais sobre a religiosidade afro-brasileira, com destaque para a Umbanda. O material inclui regimentos, estatutos de instituições, hinos, certidões de batismo religiosos e correspondências institucionais. Estes itens ainda estão em tratamento técnico pela Divisão de Processamento Técnico de Documentos Privados (Didop) do Arquivo Nacional. A previsão é que o acesso ao público ocorra apenas em 2026.
Há, ainda, a expectativa da doação de materiais audiovisuais. O conjunto inclui fitas cassete e fitas de rolo com gravações feitas por Fernandez em terreiros no Rio de Janeiro, em Salvador, na Nigéria e em Benin. Túlio Saeta, técnico da Didop, explicou que o processo técnico visa garantir que os documentos tenham identidade, sejam bem acondicionados e, se possível, sejam digitalizados.
Mara Luci Araújo, responsável pela Coordenação de Documentos Escritos (Codes), reforçou que receber e preservar esses documentos, que contam a memória de toda a nação, faz parte da missão do Arquivo Nacional.











































