A Justiça Federal solicitou explicações à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) sobre a decisão de facilitar a renovação de concessões de distribuidoras de energia elétrica que não quitaram multas aplicadas pela própria agência. Juntas, 15 empresas acumulam um total de R$ 1,18 bilhão em multas e são responsáveis pela distribuição de energia em 12 estados: Bahia, Ceará, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Paraíba, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, São Paulo e Sergipe.
O Caso Enel e a Decisão da Aneel
As multas são aplicadas quando as concessionárias falham na prestação do serviço ou descumprem metas contratuais. Algumas delas ainda estão em discussão judicial. Entre as empresas beneficiadas pela decisão da Aneel está a Enel, que em 2023 e 2024 deixou várias cidades paulistas no escuro por longos períodos. Apenas em São Paulo, a Enel acumula R$ 517,8 milhões em multas, quase metade do valor total. Uma auditoria da Controladoria Geral da União (CGU) indicou que a empresa falhou no acionamento do plano de contingência, contribuindo para os apagões.
A decisão que flexibiliza a inadimplência foi tomada pela diretoria colegiada da Aneel em 25 de fevereiro. Nela, ficou estabelecido que as multas podem ser cobradas até seis meses após a renovação das concessões, que terão vigência de 30 anos.
Ação Popular e Questionamentos
A Justiça Federal acionou a Aneel após uma ação popular movida por moradores de São Paulo, Minas Gerais e Tocantins. O advogado Gerson Rozo, representante da causa, explicou que os demandantes não buscam apenas direitos do consumidor, mas questionam a moralidade administrativa da agência reguladora. “Eles são cidadãos questionando o fato de que existe uma agência reguladora de um serviço altamente importante, essencial. Um órgão fiscalizador que, no momento em que mais se espera por ele, no sentido de cumprir a lei, cumprir as regras contratuais, esse órgão simplesmente alivia para as concessionárias em detrimento da moralidade administrativa”, argumentou Rozo.
Renovações de Concessões e Posicionamentos
A decisão da Aneel coincide com o período de renovação das concessões. No final de março, 19 empresas com contratos que se encerram até 2031 enviaram pedido de renovação, incluindo as 15 inadimplentes. Apenas a EDP Espírito Santo teve sua concessão renovada até o momento, pois, segundo a Aneel, não possuía multas em aberto. Rozo criticou a flexibilidade da Aneel, contrastando-a com a realidade de cidadãos comuns com dívidas junto ao Estado.
Em nota, a Aneel afirmou que cabe a ela avaliar o cumprimento das condições para renovação, mas que a decisão final é do Ministério de Minas e Energia (MME). A agência “recomendou ao ministério que haja a quitação das multas suspensas por decisão judicial antes da renovação da concessão”. A Aneel informou que ainda não foi oficialmente acionada pela Justiça, mas cumprirá o prazo de 72 horas para se manifestar.
O MME, também por meio de nota, confirmou a aprovação da minuta que permite a renovação dos contratos. No entanto, sobre a quitação das multas administrativas com trânsito em julgado em até 180 dias, o ministério concluiu “pela impossibilidade jurídica de inclusão dessa exigência”. O MME assegurou que, após as recomendações da Aneel para cada contrato, deliberará “pela prorrogação contratual ou pela realização de nova licitação”, garantindo que concessionárias que não atenderem aos critérios exigidos não terão seus contratos renovados.