A ascensão do fenômeno político liderado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, classificado como “populismo de direita” pelo cientista político Gabriel Rezende, demonstra sinais de enfraquecimento. Em entrevista, Rezende, doutor pela PUC-Rio, avalia que a recente condenação de Bolsonaro e a atuação do Judiciário no enfrentamento de tendências autoritárias colocam o movimento em uma rota decrescente.
Rezende, que lançará o livro A ascensão do populismo de direita no Brasil em outubro, explica que o populismo é um fenômeno político que emerge em momentos de crise. Ele identifica o bolsonarismo como a quarta onda populista do país, impulsionada pela “tempestade perfeita” das crises política, econômica e social entre 2013 e 2016.
Características do Populismo de Direita
O especialista caracteriza o populismo como uma ferramenta de representação que surge em processos de crise da democracia. Para ser enquadrado, o fenômeno precisa de:
Uma figura central carismática que agrega as insatisfações sociais.
Um discurso que se baseia no antagonismo dicotômico entre “o povo” e “a elite”.
Uso de narrativas nacionalistas (como Make America Great Again) e religiosas (como “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”).
Uso estratégico das mídias sociais.
No Brasil, o populismo de direita se diferenciou do populismo de esquerda (ou “onda rosa”) ao focar em pautas conservadoras e morais e ao se posicionar como antissistema e defensor da moral e ética na política.
Cinco Pilares do Bolsonarismo
Gabriel Rezende identificou cinco elementos estruturais que permitiram a ascensão e a mobilização do bolsonarismo entre 2016 e 2022:
Lavajatismo: O movimento se alinhou à pauta moral e ética na política, com destaque para a figura de Sergio Moro.
Evangélicos: A habilidade em mobilizar e usar narrativas conservadoras junto às lideranças evangélicas, que representam um eleitorado expressivo.
Agronegócio: O setor econômico abraçou a campanha, obtendo respaldo em pautas como a relação com a invasão de terras.
Mídias Digitais: O uso estratégico e habilidoso das redes sociais para mobilizar pautas e o eleitorado.
Militares: A aproximação com os militares como forma de moralizar a política, com a presença de membros nos escalões do governo.
O Papel do Judiciário
O cientista político avalia que o Poder Judiciário no Brasil, especificamente o STF, cumpriu o papel de guardião da Constituição e se tornou o único poder capaz de se contrapor de forma efetiva ao governo Bolsonaro. Ele vê a atuação da Corte como “responsiva”, motivada por demandas que o Executivo e o Legislativo não conseguiram resolver.
Rezende destacou que as recentes tentativas da extrema direita, como projetos de anistia e a PEC da Blindagem, são respostas ao julgamento do STF contra os acusados pela tentativa de golpe de Estado. No entanto, ele nota que o efeito tem sido contrário: a PEC, por exemplo, não foi bem recebida, por ir contra a própria pauta de “lei e ordem” pregada pelos congressistas.
Futuro do Movimento de Extrema Direita
Questionado sobre o futuro, Rezende aponta para o enfraquecimento político do populismo de direita com a condenação de seu principal líder. A proibição de Jair Bolsonaro dar entrevistas, por exemplo, retira a voz de uma figura central do populismo.
O momento atual é de rearranjo político, com outras figuras — como Michelle Bolsonaro, Tarcísio de Freitas e Silas Malafaia — tentando disputar o legado do movimento. Ao mesmo tempo, o presidente Lula não tem uma figura clara para sua sucessão na esquerda. “Abre-se um flanco muito grande de quem vai disputar o legado desse populismo”, concluiu Rezende, ressaltando que o cenário de 2026 está aberto.