Juristas consultados pela Agência Brasil classificaram como quebra de decoro parlamentar a ocupação das mesas diretoras da Câmara e do Senado pela oposição nesta semana. A ação, que impediu o funcionamento normal das Casas, sugere ainda a prática do crime de prevaricação, previsto no artigo 319 do Código Penal, quando um servidor público retarda ou deixa de praticar atos de sua obrigação.
Para o professor de direito constitucional Henderson Fürst, o motim extrapolou os limites da liberdade de expressão parlamentar e feriu o decoro. “Aquilo não foi um ato legítimo de atuação de um parlamentar no debate democrático. Inclusive, pode-se considerar uma prevaricação, pois parlamentares são funcionários públicos que atrasam suas obrigações por interesses particulares ou de terceiros”, explicou.
O artigo 5º do Código de Ética da Câmara prevê como falta de decoro “perturbar a ordem das sessões da Câmara dos Deputados ou das reuniões de Comissão”. Nesta semana, deputados e senadores de oposição mantiveram ocupação das mesas diretoras da Câmara e do Senado, impedindo a retomada dos trabalhos legislativos. O protesto foi motivado pela prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro e pedidos de anistia a condenados por tentativa de golpe de Estado, além do impeachment do ministro do STF Alexandre de Moraes.
O especialista em Direito Público Flávio Henrique Costa Pereira avaliou que, apesar da legitimidade da pauta, a forma adotada para protestar foi irregular. “Impedir o livre exercício do Legislativo não é legítimo. Eles impediram que sessões ocorressem conforme o previsto”, afirmou. Contudo, ele descartou que a ação tenha sido um atentado à democracia, defendendo que mudanças legislativas são parte do sistema de freios e contrapesos.
A senadora Tereza Cristina (PP-MS), líder da bancada ruralista, justificou a ação. “Às vezes é necessário chamar atenção para ser ouvido. Ninguém está feliz, mas foi preciso esse gesto para retomar o diálogo”, disse após deixar a mesa diretora do Senado.
Em resposta, o presidente da Câmara, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), ameaçou suspensão cautelar de mandatos por até seis meses para quem impedir atividades legislativas. PT, PSB e PSOL protocolaram ações no Conselho de Ética contra cinco deputados do PL envolvidos na ocupação.
O professor Henderson Fürst ressaltou que a decisão final sobre quebra de decoro cabe ao Conselho de Ética e à Câmara, pois, apesar de ser ilícito parlamentar, precisa ser reconhecido pelos pares. Ele destacou que o protesto não está protegido pela imunidade parlamentar.
Além disso, juristas analisaram as ações do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que defende sanções contra autoridades do Judiciário e condiciona o fim das tarifas dos EUA ao Brasil à aprovação da anistia a condenados por tentativa de golpe. Henderson Fürst afirmou que tais ações podem ser enquadradas no artigo 359-I do Código Penal, da Lei de Defesa da Democracia, que criminaliza negociações com agentes estrangeiros para atos de guerra contra o país.
O especialista em Direito Público Flávio Henrique considerou que as ações do deputado não configuram atentado à democracia, mas sim obstrução do processo judicial, violando o Código de Ética e podendo levar a processo de cassação do mandato. “Ele fere o dever de defender a Constituição e submete a soberania nacional a Estado estrangeiro”, disse.
Eduardo Bolsonaro, alegando perseguição política, mudou-se para os Estados Unidos, onde apoia sanções contra o STF e medidas tarifárias prejudiciais à economia brasileira. O PT já solicitou a cassação de seu mandato por essas ações.