A Associação de Profissionais do Audiovisual Negro (Apan) realizou nesta semana, em Brasília, uma audiência no Congresso Nacional para discutir a necessidade de ampliar as políticas afirmativas no setor audiovisual. O evento, que reuniu parlamentares, lideranças do setor e representantes da sociedade civil, teve como foco o debate sobre a inclusão e o fortalecimento da participação de profissionais negros na indústria cinematográfica brasileira.
Para a presidente da Apan, Tatiana Carvalho Costa, o momento é um “ponto de inflexão” para o cinema nacional. Apesar das conquistas recentes, o principal desafio é consolidar a reparação histórica e construir uma indústria que realmente represente a pluralidade da população negra, que é a maioria no país. Costa reforçou a importância do encontro para sensibilizar os setores da política e a sociedade sobre a manutenção e ampliação dessas ações.
Dados revelam a exclusão histórica no cinema
Pesquisas apresentadas durante a audiência reforçam a urgência da pauta. Um estudo da Agência Nacional do Cinema (Ancine) de 2016 apontou que apenas 2% dos diretores de filmes lançados comercialmente eram negros. Em 2019, um levantamento do Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa (Gemaa/Uerj) revelou que, entre 142 longas-metragens, apenas um havia sido dirigido por uma mulher negra.
Segundo a pesquisadora Márcia Cândido, do Gemaa, esses números mostram um “apagamento ou estigmatização da história da população negra” em mais de um século de cinema. As políticas afirmativas são vistas como essenciais não apenas para a inclusão, mas também para a diversificação das narrativas e representações que chegam ao público.
O cinema como instrumento de inclusão
Natália Carneiro, representante do Geledés/Instituto da Mulher Negra, destacou que o cinema é uma “máquina de fabricar imaginários”, que define quem pode ser protagonista. Ela citou o conceito de epistemicídio — a destruição de saberes e culturas de povos não ocidentais — que se manifesta na ausência de protagonistas negros, na redução a estereótipos e na negação de que possam contar suas próprias histórias.
Um estudo ainda não publicado do Geledés, mencionado por Carneiro, revelou a desigualdade na distribuição de recursos. Em 2022, homens brancos receberam cerca de 30 vezes mais investimentos públicos em seus filmes do que mulheres negras.
A cineasta e produtora Viviane Ferreira apresentou sua pesquisa “Empresas audiovisuais vocacionadas para reparação histórica”, que define essas empresas como aquelas com mais de 50% de sócios negros e/ou indígenas com poder de decisão. Ferreira, que é a segunda mulher negra no Brasil a dirigir um longa de ficção, com o filme Um Dia Com Jerusa (2020), reforçou a necessidade de fortalecer as empresas negras para garantir que a produção e o financiamento de filmes sejam sustentáveis.