Miqueias, de 24 anos, e Alex, de 25 anos, de Cerejeiras, protagonizaram um momento histórico ao se tornarem o primeiro casal homoafetivo a participar presencialmente de uma cerimônia de casamento comunitário da operação Justiça Rápida Itinerante, em Rondônia. Embora outros casais do mesmo sexo já tivessem recebido suas certidões no estado, esta foi a primeira vez que a celebração ocorreu de forma presencial.
O casamento do casal integrou as celebrações que aconteceram no último fim de semana, de 26 a 27 de julho de 2025, em dois municípios da região Cone Sul do estado: Colorado do Oeste e Cerejeiras. O casamento comunitário é uma iniciativa do Tribunal de Justiça de Rondônia (TJRO), promovida por meio da Corregedoria-Geral da Justiça e do Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos.
Na abertura da cerimônia realizada no último sábado, 26 de julho, pela manhã, na Associação Empresarial de Cerejeiras, a psicóloga Juliana Gualtieri, do Núcleo Psicossocial da comarca, parabenizou os 30 casais presentes pela decisão. “Vocês estão dizendo publicamente que essa pessoa ao seu lado é o amor da sua vida, então parabéns pela coragem”, ressaltou.
Essa coragem foi simbolizada por Alex e Miqueias. “Não foi fácil, tem que conversar com o parceiro ou a parceira para poder chegar no assunto e falar ‘vamos’, saiu do elevador muita gente e bateu o nervosismo, mas fomos muito bem recebidos por toda a equipe”, conta Alex. O Núcleo de Conciliação e Mediação (Nucomed) de Cerejeiras teve participação decisiva para o casal estar presente na cerimônia.
Diversidade e superação
A participação inédita no estado de um casal homoafetivo em uma cerimônia de casamento comunitário da Justiça Rápida vai ao encontro dos normativos sobre diversidade e equidade observados pelo TJRO. Em 2021, o Tribunal criou sua Política Interinstitucional de Equidade de Gênero, Raça e Diversidade, por meio da Resolução nº 186. Essa política é baseada em princípios dos direitos humanos e convenções internacionais de combate à discriminação, contemplando ações afirmativas, capacitações e estrutura institucional dedicada para promover a igualdade. O TJRO participa ainda do Fórum Nacional de Promoção dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+, promovido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
De origem do Mato Grosso e tendo se mudado para Rondônia após conhecer Alex, Miqueias revela que estava com bastante medo, pois moram em uma cidade pequena. “Demorei muito para dar a confirmação, porque somos um casal gay, aqui ninguém vai falar nada, mas depois provavelmente”, observa, referindo-se a situações de preconceito e homofobia que muitas vezes encontram. “Tem que enfrentar o medo se quer ser feliz, então foi com a cara e a coragem, vamos ver o que vai dar”, complementa Miqueias.
O casal está junto há dois anos e foi a partir do contato com o Núcleo de Mediação da comarca que decidiu se casar. No futuro, o casal pensa em ter filhos. Por enquanto, os jovens pretendem fazer faculdade e passar em concurso público.
A amiga do casal e chefe do Nucomed, Kelly Ansiliero, incentivou e colaborou para superar a discriminação. “Isso infelizmente é a nossa realidade, falei que faríamos o possível para garantir que fossem tratados com igualdade perante os demais casais e eles aceitaram”, lembra Kelly. Para ela, o evento superou as expectativas e o casal é exemplo de igualdade social e tratamento humanitário: “A sociedade precisa ter uma visão mais acolhedora, isso nos traz uma grande lição de aprendizado e contribuição”.
A juíza da comarca de Vilhena, Fani Angelina de Lima, coordenadora da etapa da operação Justiça Rápida Itinerante que incluiu o casamento em Cerejeiras, sublinha a importância da participação de Miqueias e Alex, além do estímulo para que outros casais homoafetivos também possam aderir à cerimônia. Ela relembra a proteção jurídica que já existe, como a decisão paradigmática do Supremo Tribunal Federal que reconheceu em 2011 a união homoafetiva como entidade familiar (ainda como união estável), e a resolução do CNJ de 2013 que determinou que pudesse ser feito o casamento civil a partir das uniões homoafetivas. “Juridicamente é uma situação bastante consolidada e a gente fica feliz que essa determinação administrativa esteja sendo aplicada. O Tribunal de Justiça se sente bastante realizado, assim como eu, de poder participar e proporcionar que esses casais tenham todos os direitos previdenciários, sucessórios e patrimoniais garantidos, como a lei determina que eles tenham”, salienta.
A coordenadora do cerimonial do TJRO, Janaína Brito, finalizou o casamento comunitário com um verso. “Hoje o amor vestiu sorrisos, alianças e coragem, amores plurais em cores e essência, que cada casal siga firme de mãos entrelaçadas, plantando o respeito em todas as suas jornadas”, declamou.