O tenente-coronel do Exército Hélio Ferreira Lima afirmou nesta segunda-feira, 28 de julho de 2025, no Supremo Tribunal Federal (STF), que o plano de “neutralização” de autoridades, apontado pela Polícia Federal (PF) como prova central de uma trama golpista favorável ao ex-presidente Jair Bolsonaro, era, na verdade, um documento de inteligência militar. Segundo Lima, o material era destinado à construção de cenários para o comandante da 6ª Divisão do Exército, em Porto Alegre.
Preso preventivamente há 9 meses, Lima foi interrogado como réu do núcleo 3 da trama golpista. Este grupo, composto por dez réus, foi acusado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) de praticar ações de campo em prol do golpe e de promover uma campanha para convencer o alto comando das Forças Armadas a aderir ao complô.
“Desenho operacional” e função da inteligência militar
Em 2022, o militar Hélio Lima estava lotado como oficial de inteligência da 6ª Divisão do Exército, com a atribuição de fornecer ao comandante cenários hipotéticos sobre diversos assuntos. Um desses cenários teria especulado sobre as conclusões do relatório de fiscalização das Forças Armadas sobre o processo eleitoral, documento produzido pelo Ministério da Defesa no fim de 2022, segundo o tenente-coronel.
De acordo com Hélio Lima, o documento apreendido pela PF em um pen drive após buscas em sua casa, nomeado “des.op.Luneta”, não se tratava de uma Operação Luneta para dar um golpe de Estado. Ele explicou que era, na verdade, um “desenho operacional”, um tipo de documento destinado a criar cenários futuros sobre acontecimentos de interesse militar. “A função do oficial de inteligência militar é reduzir incertezas e evitar a surpresa”, disse Lima. O cenário que ele trabalhava partia da premissa de que o relatório da Defesa confirmaria fraude eleitoral em 2022.
Questionado por representantes da PGR sobre o motivo de o documento considerar como “ameaça” apenas uma possível fraude por parte de “grupos de esquerda”, Lima respondeu que a esquerda havia vencido as eleições e que, portanto, se houvesse fraude, seria em favor de quem venceu o pleito. “Fraude em favor dos derrotados não faria sentido”, afirmou, acrescentando que o oficial de inteligência militar não tem lado. O tenente-coronel Lima alegou que o que ele escreveu como sendo o “resultado desejado” da “ameaça” hipotética foi transformado pela PF no resultado desejado do próprio militar, dizendo que “foi tudo invertido”. Ele negou ter recebido ordens para elaborar o documento, afirmando ser função do oficial de inteligência construir os cenários e apresentá-los ao general responsável, que poderia pedir mais aprofundamento ou descartar o cenário por completo. “Não há ordem para fazer cenário prospectivo”, explicou. Segundo o militar, seu superior à época pediu que descartasse aquela linha e passasse a cuidar de outro assunto.
Negação de monitoramento e crítica à PF
O tenente-coronel Hélio Lima negou ter ido a Brasília para monitorar o ministro do Supremo Alexandre de Moraes, uma das autoridades que seriam “neutralizadas”, de acordo com a suposta Operação Luneta. O militar apresentou documentos e mensagens da ex-esposa para demonstrar que sua viagem à capital federal teve como objetivo mobiliar o apartamento dos filhos, que moravam sozinhos e estudavam na Universidade de Brasília.
Ele também mencionou que, em suas idas a Brasília, sempre entrava em contato com o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de Ordens de Jair Bolsonaro e delator da trama golpista, por serem amigos de turma da Academia Militar das Agulhas Negras (Aman). Em um desses encontros, Cid o teria convidado a ir à casa do general Braga Netto, ex-ministro da Defesa e apontado pela PGR como um dos líderes do complô. O militar negou ter tratado sobre qualquer tipo de golpe na ocasião, tendo permanecido menos de meia hora no local. “Nem uma água eu bebi”, relatou. “Essa minha ida a Brasília foi transformada em um crime completo”, acrescentou.
Em relação ao motivo de ter permanecido em silêncio quando teve a oportunidade de depor na PF, o tenente-coronel Hélio Lima acusou o delegado Fabio Shor, responsável pela investigação da trama golpista, de dar-lhe a opção de responder a mais de 100 perguntas ou a nenhuma, prática conhecida como “silêncio parcial”. Ele alegou que “o processo não era dele, que ele só seguia as ordens de cima. E a ordem que ele havia recebido, ordem do ministro-relator, era ‘ou respondia tudo ou não respondia nada’”. O militar disse ter momentos em que se arrepende de não ter falado na ocasião. “Se tivesse insistido e falado, talvez não tivesse ficado nove meses preso”. Antes de encerrar o depoimento, ele suplicou para que pudesse aguardar em liberdade até o julgamento final da ação penal.