O seringal é dividido em várias colocações. A colocação é a área de habitação do seringueiro e que é geralmente constituída de duas a seis estradas de seringa, local onde ele realiza a atividade de extração do látex para a fabricação da borracha, e que possui em média, cerca de 150 a 200 árvores em cada estrada.
É na colocação onde o seringueiro constrói sua casa de morada, o tapiri (barraca de palha) com paredes e assoalho de Paxiuba (Socratea exorrhiza), uma espécie de palmeira da região, que depois de derrubada, ela é cortada ao meio e batida, tornando-se de grande utilidade na construção de sua moradia. Próximo a esta moradia, o seringueiro constrói também um pequeno tapiri, uma barraca de palha sem a necessidade de utilizar a Paxiuba, visto que é aberto e de chão batido. É neste pequeno tapiri, também denominado casa de defumação, e instalado em sua colocação que o seringueiro constrói o buião, destinado a defumação do látex, e a fabricação da péla de borracha, dois importantes marcadores territoriais fabricados dos seringais amazônicos.
Quando a família é numerosa, nas madrugadas, antes do início do corte da seringa, a movimentação é grande no interior da barraca. As filhas, ou a filha única, e a mãe ajudam a fazer o café, esquentam ou fazem a “boia”, a comida. Os filhos homens acompanham o pai que lhes ensina o ofício, enquanto os filhos mais velhos ensinam os mais novos e o ambiente de trabalho envolve a todos.
A casa de defumação como marcador territorial histórico tornou-se uma tradicional unidade familiar, síntese do resultado de uma existência humana criadora de cultura e alicerçada nas obras da natureza. Nesse espaço de ação, o tapiri aloja os sentimentos da família. A linguagem do espaço vivido é repassada ao lar como a mais natural forma de se criar e manter uma tradição. A presença humana lapida a existência, e a busca pelo conhecer dessa existência, é também a busca pelo conhecer do ser
O seringueiro criou o pequeno tapiri num encontro de espacialidades, territorialidades e temporalidades. Nesse encontro, a humilde barraca de palha, marcou profundamente os seus modos de vida, transformando-se num dos mais tradicionais marcadores territoriais dos seringais amazônicos. De fato, esse peculiar contexto sócio – histórico – cultural nos ensina que esses laços familiares nasceram imbricados à casa de defumação, e que por sua vez, constituiu uma singular e notável escola de gerações.
Marquelino Santana é doutor em geografia, pesquisador do Grupo de Estudos e Pesquisas, Modos de Vida e Culturas Amazônicas – Gepcultura/Unir e pesquisador do grupo de pesquisa Geografia Política, Território, Poder e Conflito da Universidade Estadual de Londrina.