O Governo de Rondônia homologou a compra de 209 impressoras Braille para a rede pública de ensino, em um processo iniciado em dezembro de 2022 e que já ultrapassa três anos sem entrega efetiva dos equipamentos às escolas. A aquisição, que supera R$ 5 milhões, foi concluída mesmo após testes oficiais e perícias técnicas apontarem falhas graves de funcionamento, incompatibilidade com o sistema educacional brasileiro e desempenho inferior ao exigido em edital.
Os documentos do processo indicam que o modelo adquirido, ViewPlus Columbia, representado pela empresa Exittus, não consegue imprimir livros didáticos completos em Braille. Ensaios técnicos independentes e perícia judicial apontam que a impressora trava antes de concluir textos mais longos, não atinge a velocidade mínima prevista no edital e apresenta desempenho até quatro vezes inferior ao informado pela própria fabricante.
Outro problema central é a incompatibilidade com o software Braille Fácil, ferramenta desenvolvida pelo Ministério da Educação (MEC) e utilizada há mais de 20 anos nas salas de recursos multifuncionais em todo o país. Essa limitação impede a integração do equipamento ao sistema já utilizado pelos professores para produção de material pedagógico, comprometendo o uso real das impressoras nas escolas rondonienses.
A forma como os testes de desempenho foram conduzidos também é alvo de críticas. Durante a avaliação realizada pela SEDUC-RO, a velocidade de impressão foi medida apenas com a repetição da letra “a”, caractere de um único ponto e que não representa o padrão real do código Braille em língua portuguesa. Especialistas apontam que o método inflou artificialmente os resultados e mascarou o desempenho real da máquina. Há ainda registros do uso do acessório externo Tiger Box, proibido pelo edital, para viabilizar o funcionamento do equipamento, já que a impressora não possui conexão autônoma via Wi-Fi ou Bluetooth.
Os documentos mostram ainda que a empresa vencedora não possui histórico de fornecimento de impressoras Braille ao setor público. Os atestados apresentados tratam da venda de itens como computadores, monitores, estabilizadores e até lixeiras, sem relação técnica com a complexidade do equipamento licitado.
Apesar das inconsistências, o processo passou por reversões sucessivas. A empresa foi habilitada, posteriormente desclassificada e depois reabilitada, sem apresentação de fatos técnicos novos. Pareceres do pregoeiro e da Procuradoria Setorial da SEDUC recomendaram a desclassificação da proposta e anulação do pregão, apontando afronta à legalidade, à isonomia e ao edital. Ainda assim, a Procuradoria-Geral do Estado classificou as irregularidades como “formais” e autorizou a continuidade da contratação.
Quase três anos após a abertura do pregão, as impressoras ainda não foram entregues, não foram fabricadas ou importadas, e alunos cegos seguem sem acesso ao material pedagógico prometido. O caso foi encaminhado ao Ministério Público de Rondônia e ao Tribunal de Contas do Estado, que receberam relatórios com indícios de manipulação de testes, inconsistências técnicas e possível favorecimento.
A denúncia alerta para desperdício de recursos públicos e para um grave prejuízo pedagógico aos estudantes com deficiência visual. A compra prevê um volume equivalente a quase 10% da produção mundial anual desse tipo de impressora, concentrado em um único modelo considerado incompatível com o sistema educacional brasileiro.
Enquanto o contrato avança, professores da educação especial seguem sem equipamentos e estudantes cegos continuam sem livros adaptados, em um dos maiores atrasos já registrados em licitações educacionais no estado.











































