Duas pesquisas divulgadas neste mês de outubro de 2025 alertam para o grave impacto dos extremos climáticos nas crianças. Uma delas, encomendada pela Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal ao Datafolha, revelou que mais de 80% dos brasileiros temem os efeitos das mudanças do clima em bebês e crianças de 0 a 6 anos.
O estudo, chamado Panorama da Primeira Infância: o impacto da crise climática, entrevistou 2.206 pessoas entre 8 e 10 de abril de 2025. A principal preocupação (71%) se concentra nos impactos sobre a saúde, com destaque para o aumento de doenças respiratórias. Outras questões levantadas pelos entrevistados incluem o maior risco de desastres (39%), como enchentes e secas, e a dificuldade de acesso a água limpa e comida (32%).
“Ver que a população reconhece o risco que as crianças enfrentam já é uma vitória — significa que entendemos quem está na linha de frente da crise e que há urgência em agir”, destacou Mariana Luz, diretora da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal.
Risco de mortalidade infantil aumenta com temperaturas extremas
Um segundo estudo, publicado no periódico Environmental Research, corrobora a preocupação da população e foi conduzido por cientistas do Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde (Cidacs/Fiocruz Bahia), da Universidade Federal da Bahia (UFBA), da London School e do Instituto de Saúde Global de Barcelona.
A pesquisa analisou mais de 1 milhão de mortes de menores de 5 anos ao longo de 20 anos, utilizando dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM). O risco de mortalidade nesta faixa etária chegou a ser 95% maior no frio extremo e 29% maior no calor extremo, quando comparado a dias de temperatura amena (entre 14°C e 21°C).
Os dados indicam que os bebês em período neonatal (7 a 27 dias) são os mais afetados pelo frio, com um risco de morte 364% maior em condições extremas. Já o impacto do calor cresce com a idade, sendo 85% maior em calor extremo para crianças entre 1 e 4 anos.
Ismael Silveira, professor do ISC/UFBA e colaborador do Cidacs, explica que o corpo das crianças não desenvolveu totalmente os mecanismos de regulação térmica, tornando-as mais vulneráveis. No calor, os riscos incluem desidratação e problemas renais, enquanto no frio há risco de hipotermia e aumento de infecções.
Impactos variam por região no Brasil
O Brasil, por suas dimensões continentais e desigualdades, serve como um “laboratório natural” para investigar os impactos climáticos. Os resultados mostram variações regionais significativas:
A mortalidade de crianças menores de cinco anos relacionada ao frio atingiu o maior aumento (117%) na região Sul do país.
A mortalidade relacionada ao calor foi maior no Nordeste (102%).
As regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste continuam com as taxas elevadas de mortes de crianças devido à maior vulnerabilidade socioeconômica e ao pior acesso a saneamento e moradia. O aumento das temperaturas representa uma ameaça adicional a essas regiões.