O Brasil vive uma crise de segurança pública que há muito deixou de ser pontual para se tornar estrutural. A recente operação policial nos complexos de favelas da zona norte do Rio de Janeiro, que resultou em 64 mortes, é um marco trágico — não apenas pela violência, mas pelo que revela sobre a negligência histórica dos governos diante do avanço do crime organizado. O episódio, o mais letal da história do Estado, escancara uma realidade que há anos é ignorada pelas autoridades: a segurança pública não é tratada como prioridade nacional.
Enquanto facções como o Comando Vermelho impõem suas próprias regras em territórios urbanos, a população vive sob constante ameaça. Barricadas, tiroteios e áreas dominadas por criminosos tornaram-se parte do cotidiano de milhares de brasileiros. A sensação é de que o Estado perdeu o controle — ou pior, de que nunca o teve. E diante disso, o silêncio das autoridades é ensurdecedor.
Nas campanhas eleitorais, o tema da segurança pública raramente ocupa espaço relevante. É como se os candidatos preferissem fingir que vivemos em um país pacificado, onde o direito constitucional de ir e vir é plenamente garantido. Mas basta acompanhar os noticiários ou conversar com qualquer cidadão para perceber que a insegurança é, hoje, uma das maiores angústias da sociedade brasileira.
Sem segurança, as demais políticas públicas ficam comprometidas. Como garantir educação de qualidade se crianças não podem ir à escola com tranquilidade? Como assegurar acesso à saúde se profissionais e pacientes têm receio de circular pelas ruas? Como fomentar o trabalho se o trajeto até o emprego representa um risco constante? A insegurança mina a cidadania, paralisa o desenvolvimento e corrói a confiança nas instituições.
A responsabilidade pela segurança é compartilhada entre União, Estados e Municípios. No entanto, o que se vê é uma atuação desarticulada, marcada por operações pontuais e ausência de planejamento estratégico. A ocupação temporária de áreas dominadas pelo crime, sem ações de longo prazo, é como enxugar gelo. É preciso presença permanente, inteligência policial, políticas sociais e, sobretudo, vontade política.
A atuação do governo federal tem sido tímida e burocrática. O Ministério da Justiça, por exemplo, parece mais preocupado em manter uma postura técnica do que em enfrentar com firmeza os desafios reais. A fuga de criminosos no Rio Grande do Norte e a resposta morosa das autoridades são exemplos da falta de agilidade que a situação exige.
É legítimo questionar por que há tanta dificuldade em aprovar medidas legislativas robustas, como uma PEC voltada à segurança pública. Quando o interesse é arrecadar mais impostos, a mobilização política é imediata. Mas quando se trata de proteger vidas, a lentidão e o desinteresse predominam. A segurança pública deveria ser tratada com a mesma urgência que os temas fiscais — ou mais.
Além disso, é preciso enfrentar o discurso que, em nome dos direitos humanos, acaba por blindar criminosos e dificultar a ação das forças de segurança. Direitos humanos são fundamentais, mas não podem ser usados como escudo para a impunidade. O verdadeiro direito humano é o de viver em paz, com dignidade e segurança.
O Brasil precisa de uma política de segurança pública que seja firme, coordenada e duradoura. É necessário ocupar os territórios dominados pelo crime, garantir a presença do Estado e devolver à população a tranquilidade que lhe foi roubada. A omissão dos governos diante dessa realidade é inadmissível. A segurança pública não é apenas uma demanda social — é uma obrigação constitucional.
O que se viu no Rio de Janeiro, com repercussão negativa no exterior, revela uma grave realidade nacional, omitida pelo governo brasileiro em suas apresentações internacionais.
Enquanto os governantes continuarem tratando a violência como um problema periférico, o país seguirá refém do medo. E cada nova tragédia, como a que vimos no Rio de Janeiro, será apenas mais um capítulo de uma história que poderia — e deveria — ser diferente.







































