O Natal chegou, mas para a extrema direita brasileira ele veio pintado de vermelho, e não é por causa do Papai Noel. Nas últimas semanas, as redes sociais viraram palco de uma sequência quase pedagógica de pânicos morais, todos inaugurados depois da campanha das Havaianas, que conseguiu o feito raro de transformar uma sandália de borracha em ameaça ideológica.
Daí foi só ladeira abaixo.
Ou, para os mais sensíveis, ladeira perigosamente à esquerda.
No meio da confusão, alguém resolveu olhar para a geladeira e fez uma descoberta estarrecedora: a cerveja Heineken tem uma estrela vermelha no rótulo.
Pronto, bastou isso.
Não importa que a estrela esteja lá desde o século XIX, que seja símbolo histórico da marca ou que exista muito antes de qualquer Guerra Fria. O que importa é vermelha, logo, suspeita, logo, comunista, logo, parte de um complô global para doutrinar o brasileiro bêbado no churrasco de domingo.
Imagino a cena:
“Amor, pega uma Heineken?”
“Tá maluco? Essa aí tem estrela vermelha. Vou de água… se não tiver gás, claro.”
Como se não bastasse, entra em cena o Tang, aquele suco em pó que atravessou gerações sem jamais levantar suspeita. Até agora.
Na embalagem, de forma escancarada, quase provocativa, está escrito:
“FAZ 1 L”
Faz, o verbo mais perigoso do dicionário bolsonarista:
Fazer políticas públicas? Comunismo!
Fazer inclusão? Agenda globalista!
Fazer um litro de suco? Melhor investigar…
E aí vem a dúvida que não quer calar, e que lanço aos meus leitores com toda a responsabilidade jornalística possível:
“Se eu beber um Tang corretamente diluído, seguindo as instruções da embalagem, eu viro comunista ou apenas hidratado?”
Para completar o pacote natalino da paranoia, temos as placas de trânsito:
“PROIBIDO VIRAR À DIREITA”
Uma afronta, um ataque direto, uma agressão simbólica à liberdade individual do cidadão conservador que só queria dobrar a esquina e acabou confrontado pelo Estado opressor do Detran.
Falta pouco para alguém acusar o semáforo vermelho de militância.
Enquanto isso, o episódio do SBT com Zezé Di Camargo serviu como cereja do bolo: críticas, boicotes, cancelamentos seletivos e pedidos de desculpa que chegaram atrasados, tortos e com aquele velho cheiro de “fui mal, mas vocês entenderam errado”.
No fim das contas, o Natal de 2025 não é sobre paz, amor ou solidariedade, é sobre vigiar sandálias, sucos, cervejas e placas, porque o verdadeiro perigo não está na desigualdade, na inflação ou na falta de políticas públicas, está na cor da estrela, no verbo da embalagem e na seta do trânsito.
O fato é que, depois da propaganda das Havaianas, a zoação tomou conta das redes, e com razão. O exagero virou piada, o pânico virou meme e a indignação seletiva virou entretenimento.
Pensamento do dia:
“Se a estrela vermelha da Heineken assusta, imagina quando descobrirem que o Papai Noel usa roupa da mesma cor.”











































