Uma pesquisa lançada nesta segunda-feira (24), intitulada Engrenagem Seletiva: o Tratamento Penal dos Crimes de Drogas no Rio de Janeiro, aponta uma alta desigualdade racial e socioeconômica no Sistema de Justiça Criminal fluminense, com a população negra sendo sobrerrepresentada em todas as fases do processo.
O estudo, realizado pelo Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC), analisou 3.392 casos enquadrados na Lei de Drogas (tráfico, associação e porte para consumo).
Sobrerrepresentação e desfechos desiguais
A análise estatística revela que a composição racial no Sistema de Justiça Criminal é de 58% de pessoas negras e 42% de brancas. No entanto, o nível de punição para pessoas negras é desproporcional:
| Indicador | Pessoas Negras | Pessoas Brancas |
| Percentual entre os Acusados | 69% | Não especificado |
| Percentual entre os Condenados | 77% | Não especificado |
| Sentenças em Favelas/Comunidades que resultam em Condenação | Quase 80% | Não especificado |
| Probabilidade de Receber Transação Penal (Acordo) | 43% a menos de chance que brancos | Mais chance |
O professor Ignacio Cano, da UERJ, destacou que a proporção de negros aumenta à medida que o processo judicial avança, o que “responde a um racismo estrutural na sociedade brasileira.”
Punição e Local de Ocorrência
O local da ocorrência e a raça são marcadores cruciais de seletividade. O estudo constatou que:
Sentenças de Condenação: 76,5% das sentenças condenatórias citam explicitamente que o local da ocorrência foi uma favela ou comunidade. Em territórios sob domínio de facções criminosas, o número sobe para 79,3%.
Abordagem e Residência: Moradores de bairros de maior renda estão “praticamente ausentes” dos registros policiais, enquanto pessoas abordadas por uso de drogas em áreas ricas da cidade, geralmente, são oriundas de áreas de baixa renda.
O professor de Direito Penal Salo Carvalho, da UFRJ, avalia que o fator territorial aumenta exponencialmente a probabilidade de condenação. “Acaba sendo uma criminalização genérica de toda uma população,” disse.
Diferenças nas Penas e Transação Penal
O punitivismo e a seletividade penal também ficam evidentes nas penas aplicadas e nos acordos de transação penal:
Pena Média: A média da pena de prisão por crimes de drogas para negros chega a 1.172 dias, enquanto para brancos a média é de 810 dias.
Transação Penal: O acordo para evitar o processo criminal é oferecido majoritariamente aos acusados brancos (60,8%). Os pesquisadores observam que as pessoas brancas são as que mais se beneficiam do instrumento, sendo mais enquadradas nos artigos de porte para consumo pessoal.
Outro dado é a influência do tipo de droga: a maconha é mais comum em casos de uso (59,6%), enquanto a cocaína é mais frequente em casos de tráfico (79,5%). A imputação inicial por tráfico ou associação resulta em alta probabilidade de denúncia pelo Ministério Público (94%).











































