O conhecimento em matemática define quem detém e exerce poder na sociedade moderna, segundo o matemático e diretor-geral do Instituto de Matemática Pura e Aplicada (Impa), Marcelo Viana. Em entrevista à Agência Brasil, ele defendeu que a democratização do ensino de matemática é uma questão de justiça, cidadania e empoderamento na era da inteligência artificial (IA) e dos algoritmos.
Viana explica que a matemática passou a guiar a vida das pessoas de formas mais invasivas do que antes. “Se você submete um pedido de crédito, a decisão provavelmente vai ser tomada por uma inteligência artificial, que é baseada em matemática. Se você não tem o conhecimento, você está à mercê de quem utiliza esse conhecimento”, destacou Viana.
Conhecimento matemático como direito fundamental
O diretor-geral do Impa, que recentemente lançou o livro A Descoberta dos Números, defende que o acesso ao conhecimento matemático, ou a alfabetização matemática, é um direito fundamental do cidadão. Ele compara a importância desse conhecimento à alfabetização tradicional, essencial para o exercício pleno da cidadania.
Viana citou o documentário Counted Out (Excluídos pela Matemática) para exemplificar o uso da matemática como poder. Ele narrou a história de um prisioneiro americano que teve sua condicional negada por um algoritmo. O prisioneiro só conseguiu reverter a decisão após estudar o funcionamento do algoritmo, provando que ele tinha viés e preconceito. “Contra algoritmo não tem argumento”, alertou o matemático.
Matemática e a geração de riqueza
Além de ser uma ferramenta de cidadania e empoderamento, a matemática é um gerador de riqueza. O matemático citou um estudo que avaliou que as profissões que usam matemática geram 4,6% do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil, o que corresponde a cerca de R$ 450 bilhões.
Viana apontou que esse percentual é significativamente menor que o de países avançados, onde fica entre 15% e 18%. Se o Brasil atingisse 18% do PIB como a França, o país somaria mais de R$ 1 trilhão por ano à economia. Para isso, é crucial ter mais jovens com um bom relacionamento com a disciplina, capazes de usar a matemática para resolver problemas em setores como agronegócio, mercado financeiro, saúde e energia.
Os desafios da desigualdade na educação
Em relação ao ensino no Brasil, o diretor-geral do Impa reconheceu que o país é extremamente desigual, o que se reflete na qualidade da educação oferecida às classes menos favorecidas.
Viana apontou que, além da desigualdade, há um problema generalizado de qualidade, já que as melhores escolas do Brasil raramente são competitivas em nível internacional. O principal desafio é a valorização do professor, que envolve não apenas a questão salarial, mas também a progressão de carreira e a deficiência na formação nas licenciaturas.