Uma intensa disputa pelo mercado brasileiro de automóveis se desenha entre as principais montadoras que atuam no país. De um lado, a fabricante chinesa BYD, com crescente presença no Brasil, e do outro, um grupo formado por Toyota, General Motors, Volkswagen e Stellantis. A controvérsia gira em torno das tarifas de importação de veículos elétricos e híbridos desmontados.
O Posicionamento da Anfavea
As montadoras tradicionais, representadas pela Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), com mais de sete décadas de atuação no Brasil, enviaram uma carta ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva em junho. Nela, as empresas expressam preocupação de que investimentos e empregos estariam em risco caso o governo aceite o pedido da BYD para reduzir, temporariamente, a tarifa de importação de kits de veículos elétricos ou híbridos desmontados.
A carta, divulgada pelo presidente da Volkswagen, Ciro Possobom, em uma rede social, argumenta que a importação de conjuntos de peças não seria uma transição para um novo modelo de industrialização, mas sim um padrão operacional que tenderia a se consolidar, reduzindo a abrangência do processo produtivo nacional. A Anfavea destacou seus planos de investir R$ 180 bilhões nos próximos anos, afirmando que esse ciclo virtuoso seria abalado por incentivos à importação de veículos desmontados.
A Contra-Argumentação da BYD
Em resposta, a fabricante chinesa BYD enviou uma nota à Agência Brasil, classificando a posição da Anfavea como uma reação contra a inovação e a abertura do mercado brasileiro. A BYD descreveu a postura das concorrentes como “chantagem emocional com verniz corporativo, repetida há décadas pelos barões da indústria para proteger um modelo de negócio que deixou o consumidor brasileiro como último da fila da modernidade”. A empresa chinesa defende que o que seus concorrentes chamam de prática desleal é, na verdade, concorrência. “Agora, chega uma empresa chinesa que acelera fábrica, baixa preço e coloca carro elétrico na garagem da classe média, e os dinossauros surtam”, completou a BYD.
A BYD argumenta que a redução temporária de imposto solicitada é razoável, pois não faz sentido aplicar a mesma tributação a veículos 100% prontos importados e a veículos montados no país. A empresa salienta que a medida seria temporária, apenas enquanto conclui as obras da fábrica em Camaçari (BA), que já está finalizando sua primeira etapa em menos de um ano e meio.
Decisão em Discussão na Camex
O Comitê-Executivo de Gestão (Gecex) da Câmara de Comércio Exterior (Camex), ligado ao Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC), está discutindo os pleitos das montadoras em uma reunião extraordinária nesta quarta-feira (30). As montadoras tradicionais querem antecipar, de 2028 para 2026, a elevação das tarifas de importação para carros elétricos desmontados, o que poderia impactar a BYD. Por outro lado, a BYD pede a redução temporária do imposto de importação de veículos desmontados, alegando a necessidade de tempo para nacionalizar a produção.
O vice-presidente e ministro do MDIC, Geraldo Alckmin, explicou que o governo vai discutir possíveis mudanças na fase de transição para a elevação das tarifas de importação. Ele lembrou que, em 2023, a alíquota para veículos elétricos e híbridos era de 0%, e a estratégia do governo foi fazer uma transição gradual até atingir os 35% cobrados de outros veículos importados, incentivando a fabricação local. Alckmin citou como sucesso a instalação de fábricas como a da chinesa GWM em Indianópolis (SP) e a da BYD em Camaçari (BA).
Uma das hipóteses em estudo na Camex é ampliar a cota de isenção para importação, argumentando a necessidade de tempo para nacionalizar a produção. Alckmin indicou que a Camex pode chegar a uma solução intermediária, que atenda a Anfavea antecipando a alíquota de 35% para 2026, e, em vez de uma redução tarifária, estabeleça uma cota até 1º de julho de 2026. A decisão final será debatida no Gecex e posteriormente na Camex, que envolve 10 ministérios.