O analista de inteligência Clebson Ferreira de Paula Vieira, atuante no Ministério da Justiça durante a gestão de Jair Bolsonaro, revelou nesta segunda-feira (14) ter recebido ordens para compilar dados que pudessem criar um vínculo entre o então candidato à Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva, e facções criminosas. O depoimento ocorreu no Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília, no âmbito de uma ação penal que investiga a suposta tentativa de golpe de Estado.
Demanda por dados eleitorais
Segundo Vieira, o pedido era para analisar uma possível correlação estatística entre a concentração de votos em territórios do Comando Vermelho (CV), no Rio de Janeiro, e a votação de Lula. A demanda, que visava verificar se o candidato tinha maior concentração de votos em áreas dominadas por facções criminosas, chegou em 2022, quando ele era chefiado pela delegada Marília de Alencar, diretora de Inteligência da Secretaria de Operações Integradas do Ministério da Justiça. Marília é ré na ação penal.
Clebson Vieira afirmou que outras solicitações sobre dados eleitorais pediam a identificação de localidades onde cada candidato superou 75% dos votos no primeiro turno. Contudo, apenas as informações referentes a Lula foram consideradas pela chefia, demonstrando um viés. O analista confirmou ter desabafado com sua esposa sobre o mal-estar causado por demandas com “algum tipo de viés político, referente a tentar ajudar o governo”.
Ações da PRF sob investigação
Adiel Pereira Alcântara, ex-coordenador de Inteligência da Polícia Rodoviária Federal (PRF), também foi ouvido no mesmo dia. Ele reiterou a ocorrência de orientações para “policiamento direcionado” durante as eleições de 2022. Alcântara indicou que a fiscalização de vans e ônibus foi intensificada em estados como Goiás, São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Essas regiões são pontos de partida para eleitores com destino ao Nordeste, onde Lula tradicionalmente obtém maior votação.
Núcleo golpista no STF
Os depoimentos das testemunhas de acusação visam o Núcleo 2 da trama golpista, apontado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) como responsável por ações estratégicas. Este núcleo é acusado de monitorar opositores e de elaborar documentos para subsidiar a tomada de poder.
Entre os integrantes deste núcleo estão Filipe Martins, ex-assessor de Assuntos Internacionais de Bolsonaro; Marcelo Câmara, também ex-assessor; Silvinei Vasques, ex-diretor da PRF; General Mário Fernandes; Marília de Alencar, ex-diretora de Inteligência do Ministério da Justiça; e Fernando de Sousa Oliveira, ex-secretário-adjunto de Segurança do Distrito Federal. O tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro e delator da trama, foi novamente ouvido na tarde desta segunda-feira, em audiência conduzida pelo juiz Rafael Henrique Janela Tamai Rocha, auxiliar do ministro Alexandre de Moraes.