A Justiça Federal proferiu na terça-feira (1/7) sentença histórica ao julgar procedente a Ação Civil Pública movida pela Associação Cidade Verde (ACV) – entidade de defesa dos consumidores -, juntamente com a Defensoria Pública do Estado, Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/RO) e os Ministérios Públicos Estadual e Federal, reconhecendo a precariedade no fornecimento de energia em Rondônia e determinando que a concessionária de energia elétrica adote medidas para evitar novos apagões. A decisão responsabiliza a má prestação do serviço e impõe obrigações para garantir o fornecimento regular e eficiente à população rondoniense.
A decisão fixou indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 500 mil, a ser revertida ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos, e determinou multa de R$ 500 mil por ano caso os índices regulatórios de qualidade do serviço (DEC e FEC) descumpram os limites fixados pela Aneel. Além disso, determinou que a concessionária passe a informar previamente os consumidores sobre manutenções e interrupções programadas, em respeito ao direito à informação. Não há multa para descumprimento desta ordem.
A ação, ajuizada ainda em 2015, surgiu como resposta ao colapso do sistema elétrico vivenciado no estado, que por anos, enfrentou apagões constantes de energia. Empresas acumulavam prejuízos milionários, escolas e hospitais operavam sob risco constante, o comércio parava, e a população enfrentava calor extremo sem resposta. A situação se agravava especialmente em períodos de pico, como feriados e estiagens prolongadas.
Liminar com multas altas impediu apagões
Durante o ápice dos apagões, em 2017, a então juíza federal substituta Laís Durval Leite deferiu liminar após uma série de esforços, incluindo peticionamentos e reuniões presenciais com a magistrada, por parte do advogado Gabriel Tomasete, da Defensoria Pública do Estado e da vice-presidente da OAB/RO à época, Maracélia Oliveira. A medida foi considerada um marco, por impedir novas interrupções sob pena de R$ 100 mil por hora e, caso ocorresse, a imediata divulgação de informação aos consumidores das áreas atingidas sobre as causas e soluções dadas para evitar possíveis repetições no prazo máximo de 3 horas do restabelecimento, por meio de mídia televisiva, rádio e internet, sob pena de multa por hora excedente no valor de R$ 50 mil.
Piores índices em Rondônia
Nas alegações finais no processo, a ACV demonstrou que Rondônia apresentava os piores índices FEC (frequência das interrupções) e DEC (duração média das quedas) do país. Mesmo com os limites excessivamente permissivos da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para Rondônia, os dados mostraram que a concessionária os ultrapassava de forma reiterada, escancarando a necessidade de uma resposta judicial firme. Com base nisso, a sentença confirmou que o fornecimento era inadequado e que medidas estruturais precisam ser implementadas para assegurar o direito básico à energia elétrica de qualidade.
“Reconhecer o problema já foi um avanço. Mas fixar R$ 500 mil de dano moral coletivo — menos de R$ 1 por unidade consumidora — nos faz questionar se haverá qualquer incômodo para a concessionária. Já em relação à multa, o valor incidindo apenas uma vez ao ano, a sensação que fica é a de que desrespeitar o consumidor seguirá valendo a pena em nosso estado”, comentou o advogado Ronilson Pelegrine, da região de Cacoal (RO).
“Houve persistência e responsabilidade. Representamos a sociedade civil em uma luta que não era contra empresas, mas a favor da dignidade da população. Agora, temos uma decisão que garante o direito a um serviço essencial prestado com qualidade, como manda a Constituição”, declarou Gabriel Tomasete, advogado que atuou como patrono da ação pela entidade da sociedade civil organizada. Ele informou que será analisada a viabilidade de apresentar recurso em relação a pontos que não foram acolhidos na sentença e que impactam na efetividade do título executivo em prol dos consumidores de energia elétrica e do próprio estado.