Leonardo Ulrich Steiner, primeiro cardeal-bispo na Amazônia, passou a ser cotado diante de uma Igreja que precisa decidir se quer continuar mantendo a visão de Francisco ou se fechar em um estilo mais conservador com papas europeus: “Eu prefiro um papa progressista que continue as pegadas do Papa Francisco e que modernize a Igreja”.

Nascido no Sul do país, mais precisamente no município de Forquilhinha, região de Santa Catarina, Leonardo Ulrich Steiner já fez história ao ser consagrado pelo Papa Francisco como o primeiro cardeal-bispo de Manaus em 2022. Mas não é só isso; a nomeação dele o coloca na lista dos primeiros a assumir o posto pela Igreja Católica Apostólica Romana na Região Amazônica.
Este ano, durante a 58ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, que aconteceu em Genebra, na Suíça, o cardeal de Manaus, que ocupa a presidência do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) – o qual já foi chefiado pelo arcebispo de Porto Velho (RO), Dom Roque Paloschi –, denunciou, diante das Nações Unidas (ONU) e do Alto Comissariado, os ataques aos povos indígenas no Brasil e, inclusive, a percepção da IC que enxerga como inconstitucional a aprovação do “Marco Temporal”, a Lei 147/2023, que estabelece que a demarcação das terras indígenas será baseada na ocupação ou disputa das terras pelos indígenas na data da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988.
No trecho publicado pela Vatican News, o cardeal Steiner denunciou a violação dos direitos desses povos indígenas, pontuando que a lei não tem feito senão favorecer interesses de terceiros. “Neste momento, reformados e negociados para atender a interesses particulares que querem explorar economicamente os territórios, principalmente a mineração. Isso acontece através de uma mesa de negociação criada pela Suprema Corte, que pretende buscar acordos sobre direitos que são indisponíveis e inalteráveis, um retrocesso gravíssimo”, disse ele na reportagem publicada em 4 de março de 2025.

A escolha e nomeação de Steiner por Francisco não foi por acaso: Francisco queria pontuar a importância da Amazônia no mundo, na visão da Igreja Católica como defensora do meio ambiente e, com isso, reafirmar a necessidade de preservá-la caso a humanidade queira continuar existindo. Em 2019, Francisco escreveu um estudo sobre a Amazônia, numa visão de integração entre os habitantes. Disse que o sonho era de uma Amazônia unida e que promovesse seus habitantes de maneira que vivessem bem. “Mas impõe-se um grito profético e um árduo comprometimento em prol dos mais pobres.”
Com o conclave que começa no dia 7, onde a Igreja Católica escolherá seu novo líder, as apostas se voltam também para um possível defensor da natureza, como o Papa Francisco, que por diversas vezes emitiu pareceres com vistas à proteção das florestas para seus governantes. Ulrich Steiner, assim como outros cardeais, tinha a bênção do Papa Francisco.
Aliás, ele figura na lista dos poucos que Francisco tinha em alta dentro da Igreja Católica, justamente pela visão humanista e menos conservadora, aliada a uma Igreja Católica que percorre o mundo levando a missão não apenas teórica, mas prática do que pede Jesus: “Se preciso, humilhe-se perante os seus pela paz.” Francisco pregava uma Igreja Católica menos fechada e mais aberta, uma IC de ações concretas. Ele mesmo chegou a declarar: “Uma Igreja que não sai às ruas vira ONG, e nós não queremos ser uma ONG.”
Ainda que apontado por meios de comunicação internacionais como a Reuters, Leonardo Ulrich Steiner é um possível escolhido, mas tem pela frente uma missão difícil: convencer a maioria dos cardeais europeus, que detêm a maioria dos votos no conclave, de que pode e tem todas as prerrogativas para ser o “pastor” da Igreja Católica. Não apenas isso, Ulrich precisa, antes de tudo, mostrar que é um homem que pode consolidar o legado deixado pelo Papa Francisco, o qual elevou a Igreja Católica a um patamar jamais visto na história, exortando a Casa de Deus a ser um verdadeiro templo da humildade, em que os mais frágeis pudessem se enxergar. Não por acaso, suas ações desagradaram até mesmo membros da Igreja que ainda fecham os olhos para o verdadeiro papel de uma IC mais humanista.
Na outra parte dessa possível escolha, existem personagens que não estão convencidos dessa propaganda, no Brasil, de ter um papa. O passado com padres que colocam a fé em rituais artísticos e milionários, além da pouca atuação da própria Igreja no cenário brasileiro, pesa desfavoravelmente. “Em São Paulo, tem o padre Júlio Lancelot que atua diretamente com a população de rua e, ainda assim, é atacado pelo bem que faz. Mas você acredita que esse ataque não é apenas político, como acontece com os políticos? Existem pessoas da própria Igreja, padres que torcem contra a ação de Lancelot. E do que estou falando é de um Brasil de fachada, que muito fala e pouco ajuda. Será mesmo que estamos preparados para um papa que pensa mundialmente?”, pontua uma pedagoga que a reportagem não irá identificar.
Mas nem todos pensam da mesma maneira. Para a ativista e indigenista Nedinha Suruí, da Associação de Defesa Etnoambiental – Kanindé, a possibilidade de um papa brasileiro, e ainda da Amazônia, fortaleceria as ações em prol dos cuidados com a floresta. “Para nós, do Brasil, seria muito bom, principalmente saindo da nossa região do país”. “Eu prefiro um papa progressista que continue as pegadas do Papa Francisco e que modernize a Igreja”, declara.
Um brasileiro ou um filipino? Francisco também tinha Luiz Antônio Tagle como um de seus queridinhos. Um cardeal de 67 anos, jovem e que segue linha parecida com a do falecido Papa Francisco. Mas caberá aos cardeais a missão de escolher o homem que liderará pouco mais de 1,4 bilhão de católicos. Independentemente da nacionalidade, que Jesus aponte o melhor para o nosso atual momento, que tem carecido de fé e compaixão pelo próximo. “De verdade, espero que eles escolham um papa que mantenha a maneira do Papa Francisco, que se mostrava um papa mais humano, um homem que se humilhava quando era preciso, perante os chefes de Estado. Ele mostrou uma Igreja Católica da forma que Jesus pede: na rua e menos dentro dos templos. Um papa europeu agora poderia descontinuar tudo aquilo que Francisco deixou em 12 anos de papado. Eu não coloco muita fé nessa escolha do papa de Manaus, mas nunca se sabe”, finaliza o estudante de Letras que mantém o anonimato.