Por Marquelino Santana
A pesquisa participante como eixo central da metodologia, possibilita com maior precisão a inserção do pesquisador e sua relação com os atores sociais da pesquisa. Ela nasce de um entrelaçamento que envolve intimamente pesquisador e pesquisado, de forma que ambos se tornem sujeitos que visem transformar uma situação vigente. Para a psicóloga Maria Luiza Sandoval Schmidt, a pesquisa participante, neste cenário, representa um caminho ou uma via de aprofundamento desta renovação, pois, buscando o sentido da alteridade, predispõe-se à autorreflexão.
Através da pesquisa participante, é possível caminhar lado a lado com as coletividades, compartilhando os mesmos momentos e sentindo as mesmas dificuldades. Pedro Demo nos diz que apesquisa participante não é somente possível, mas necessária para repormos a inter-relação dinâmica entre teoria e prática. Neste sentido, o mesmo autor argumenta que se for coerente, a pesquisa participante não fugirá de sempre retornar à teoria para se refazer. Segundo ele, recuperar o espírito crítico é condição de criatividade, evitando afogar-se no ativismo.
A vivência na pesquisa participante, oportuniza o pesquisador e pesquisados, tornarem-se atores de suas ações. O espaço vivido de coletividades tradicionais ou originárias, por exemplo, traz no seu bojo um legado de valores que nas suas autenticidades e alteridades, brotam significações e presentificações, em territorialidades onde o material e o imaterial se fundem para dar lugar ao imaginário mundo amazônico.
Para Carlos Brandão e Danilo Streck, uma situação vigente para ser transformada no âmbito de investigações acadêmicas, o ponto de origem da pesquisa participante deve estar situado em uma perspectiva da realidade social e tomada como uma totalidade em sua estrutura e em sua dinâmica. Os mesmos autores, acrescentam ainda que se deve partir da realidade concreta da vida cotidiana dos próprios participantes individuais e coletivos do processo, em suas diferentes dimensões e interações.
O pesquisador precisa estar sempre atento a todos os passos de sua investigação. É notório que o investigador que convive na cotidianidade dos pesquisados, cria-se um efeito natural de relacionamento intrínseco entre ambos. Porém, o pesquisador carece de ser dotado de uma consciência pautada na ética e ao mesmo tempo atentar a qualquer ato que se torne autoritário, manipulador e ofensivo à coletividade pesquisada, visto que, segundo Pedro Demo, existem, igualmente, sérias dificuldades metodológicas, desde a pretensão vã de se construir como única forma válida de pesquisa, até posturas meramente ativistas que banalizam não só a ideia de pesquisa, como também a ideia de participação.
Segundo nos informa o referido autor, a potencialidade disruptiva do conhecimento esteve sempre reservada aos privilegiados, sem falar que o acesso ao conhecimento sempre foi via áurea de ascensão social, substituindo, muitas vezes, até mesmo o poder do dinheiro. O mesmo autor ainda ressalta que a pesquisa participante coloca o dedo nesta ferida. Ela abala o eurocentrismo fundado na superioridade do conhecimento, mostrando, primeiro, que a ciência contém, em suas entranhas, projetos de sociedade de poucos privilegiados e muitos deserdados e, segundo, que os marginalizados poderiam cultivar melhor sua autonomia, caso tivessem acesso mais adequado à qualidade formal e política do conhecimento.
A pesquisa participante nos instiga a saber pensar e agir e a entrelaçar-se aos sujeitos, ao tempo em que ambos tornar-se-iam atores da sua própria transformação. Esta pesquisa é vivência, não simplesmente por estar vivendo, mas uma vivência de ser no mundo e com o mundo. Para Martin Heidegger, faz-se necessário aqui, saber ouvir e ser capaz de aprender, em vez disso o que se poderá encontrar será apenas o funcionamento rotineiro do desconhecimento do assunto.
Marquelino Santana é doutor em geografia, pesquisador do Grupo de Estudos e Pesquisas, Modos de Vida e Culturas Amazônicas – Gepcultura/Unir e pesquisador do grupo de pesquisa Geografia Política, Território, Poder e Conflito da Universidade Estadual de Londrina.