Ativistas, cientistas e ambientalistas estão intensificando o apelo para que o Cerrado receba a mesma importância política e prioridade dada à Floresta Amazônica. A reivindicação ocorre enquanto o mundo se prepara para a 30ª Conferência da ONU para Mudanças Climáticas (COP30), que será realizada em Belém, no Pará.
O Cerrado, que ocupa 23,3% do território nacional, é chamado de “berço das águas” por abrigar as nascentes de oito das 12 bacias hidrográficas do Brasil. Estima-se que 40% da água potável do país venha do bioma.
O desmatamento, grande parte impulsionado pela expansão do agronegócio, estaria aprofundando a redução das vazões hídricas. O geógrafo Yuri Salmona, doutor em ciências florestais, ressaltou: “O desmatamento no Cerrado é um problema nacional por muitos motivos, mas especialmente porque ele impacta o maior insumo do país: a água”.
Redução de vazão e risco hídrico
Uma pesquisa da Ambiental Media analisou as seis principais bacias do bioma e calculou que o Cerrado perdeu 27% da vazão mínima média em comparação com a década de 1970. Isso equivale à perda de 30 piscinas olímpicas de água a cada minuto.
O estudo atribui 56% dessa retração ao desmatamento e à mudança no uso do solo, e 44% às mudanças climáticas. O Rio São Francisco, por exemplo, que tem 90% das nascentes no bioma, perdeu metade de sua vazão desde os anos 1970.
A Agência Nacional de Águas (ANA) já reconhece que, até 2040, o Brasil pode perder até 40% da água em regiões do Norte, Nordeste, Centro-Oeste e parte do Sudeste.
Código Florestal e Desmatamento Legal
A situação é agravada pelo Código Florestal. Enquanto o desmatamento nas propriedades da Amazônia é limitado a 20%, no Cerrado é permitido desmatar até 80% das áreas privadas. O bioma registrou, em 2024, uma área desmatada maior do que a da Amazônia pelo segundo ano consecutivo.
O Ministério do Meio Ambiente (MMA) reconhece que mesmo o controle total do desmatamento ilegal é insuficiente. O secretário André Lima destacou que o avanço do desmatamento no bioma vem atrasando o início das chuvas, impactando a agricultura e a geração de energia. A estação chuvosa no bioma acumula um atraso de 1 mês e 26 dias se comparada à década de 1980.
A ecóloga Isabel Figueiredo (ISPN) salientou que as autorizações para a supressão de vegetação nativa são dadas pelos estados. Ela também criticou a falta de interesse da cadeia produtiva da soja em implementar a rastreabilidade dos grãos, para identificar áreas de plantio e respeitar a legislação ambiental.
Posição do Agronegócio
A Frente Parlamentar Agropecuária (FPA) e a Aprosoja (associação de produtores de soja) se manifestaram. A FPA afirmou não reconhecer o estudo da Ambiental Media por falta de “metodologia científica comprovada” e destacou que o combate a crimes ambientais é prioridade.
A Aprosoja, por sua vez, defendeu que o regime de chuvas do Cerrado favorece o cultivo da soja sem irrigação (cerca de 95% da área cultivada) e que a planta ajuda a infiltrar a água no solo, desde que haja boas práticas.









































