A Academia Brasileira de Letras (ABL), no Rio de Janeiro, foi palco da formatura da Universidade das Quebradas nesta terça-feira (14), com 46 novos escritores celebrando suas trajetórias e a importância da literatura vinda das periferias. O evento foi aberto pela escritora Ana Maria Gonçalves, a primeira mulher negra eleita para a ABL, que ressaltou a força criativa dos formandos.
“Eu acredito que tudo de mais interessante, tudo de novo, tudo de ousado, tudo com potência de mudar a sociedade brasileira, vem das periferias, vem das quebradas”, disse Ana Maria Gonçalves.
Extensão universitária e estudo de Ariano Suassuna
A Universidade das Quebradas é um projeto de extensão da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), idealizado por Heloísa Teixeira e Numa Ciro. A iniciativa, que visa formar novos escritores, especialmente de áreas periféricas, é realizada em parceria com o Instituto Odeon e a ABL.
Os alunos, carinhosamente apelidados de “quebradeiros e quebradeiras”, têm aulas na sede da ABL e utilizam obras de seus imortais como material didático. A turma de 2025 mergulhou na obra do escritor e dramaturgo Ariano Suassuna, que une literatura, arte popular e identidade brasileira.
Como trabalho final, os formandos lançaram o livro Suassuna Quebradeiro, uma coletânea de contos e peças produzidas por eles, disponível na internet.
Trajetórias de transformação
O curso proporciona um ambiente de aprendizado potente, unindo o saber acadêmico à experiência dos alunos. O escritor Ismael Queiroz Dias, 29 anos, que se identifica como indígena, negro e caucasiano, afirmou que o curso foi enriquecedor, apesar de já ter um livro publicado.
“É um orgulho estar aqui me formando hoje e estar falando em nome de muita gente, dos meus ancestrais, de todas as pessoas que vieram antes de mim,” revelou Ismael.
Para Lady Victória Padilha, 23 anos, graduanda de Letras-Português na UFRJ e natural de Manaus, o curso leva a universidade para quem tem uma realidade mais distante da academia. Seu conto na coletânea, O Jovem Vendedor de Codajás, é um conto de humor que abraça suas raízes do Norte e aborda a cultura de vendas de açaí.
Rose de Souza Garcia, de 60 anos, também ex-aluna da UFRJ, buscou o curso após publicar seu primeiro conto. Ela reconhece a rigidez de alguns processos institucionais, mas valoriza a troca: “é um aprendizado porque a gente está junto, trocando e conhecendo também as realidades de outros escritores”.
Carlos Gradim, presidente do Instituto Odeon, resumiu a filosofia do projeto: “A gente tem um lugar muito de escuta, porque a gente entende que, nos territórios aos quais a gente seleciona esses jovens, há um saber muito potente que já está posto e a gente traz, de alguma forma também, o saber acadêmico que dialoga com esse saber existente”.