O diretor de Políticas Públicas da Fundação Santillana, André Lázaro, aponta a naturalização das desigualdades como o principal quadro estrutural que impede a redução das disparidades na aprendizagem de crianças e jovens nas escolas brasileiras. Em entrevista publicada em 1º de outubro de 2025, em São Paulo, ele defende que a educação deve ser um direito e não pode continuar sendo uma herança de classe.
Lázaro, que já foi professor da educação básica, cita a frase de Joaquim Nabuco no século 19, sobre a dificuldade do Brasil em admitir a igualdade de todos após 300 anos de escravidão. Para ele, o país ainda luta para afirmar a igualdade perante a lei como um valor.
Diferenças Drásticas na Aprendizagem
Os dados do Anuário Brasileiro da Educação Básica 2025 reforçam a crítica do especialista. A pesquisa, elaborada pelo Todos Pela Educação, Fundação Santillana e Editora Moderna, mostra um abismo na aprendizagem entre os alunos mais ricos e os mais pobres.
Jovens mais pobres: Apenas 2,4% dos alunos do 3º ano do ensino médio na parcela dos 20% mais pobres tiveram aprendizagem adequada em matemática e em língua portuguesa em 2023.
Jovens mais ricos: O índice salta para 16,3% entre os 20% mais ricos.
O especialista ressalta que as diferenças, ao examinar o recorte entre urbano e rural, e entre ricos e pobres, chegam a 20 pontos percentuais em algumas regiões do país.
Questões Raciais e o Cenário do Campo
André Lázaro cita a questão racial e a condição em áreas rurais como pontos cruciais para a equidade. “A população negra continua vivendo na educação desvantagens inaceitáveis para uma visão republicana”, afirma.
Ele destaca ainda o cenário no campo:
Existem 5 milhões de matrículas na educação no campo, representando 12% do total nacional.
Entre 2014 e 2024, 16 mil escolas municipais dos anos iniciais foram fechadas no campo.
Lázaro critica essa pressão, que não está ligada apenas à mudança demográfica, mas é uma força que “expulsa as famílias do campo”, levando-as a vender a terra e perdendo para a concentração fundiária.
Escolas Públicas e Privadas: Desafio Nacional
O anuário mostra que a rede pública está em desvantagem em relação à rede privada, mas o problema é nacional.
Escolas Públicas: Apenas 4,5% dos jovens do 3º ano do ensino médio tiveram aprendizagem adequada em matemática e em língua portuguesa.
Escolas Privadas: O índice chega a 28%.
Apesar da diferença, Lázaro aponta que a aprendizagem insuficiente dos chamados saberes clássicos afeta toda a rede de ensino. “No final do ensino médio, mesmo as escolas privadas, mesmo os 20% mais ricos, têm aprendizagens insuficientes, proporcionalmente falando”, afirma, destacando que os resultados são ruins mesmo confrontando com parâmetros internacionais como o Pisa.
Conquistas e Carências do Sistema
O professor reconhece as conquistas históricas da sociedade para garantir o direito à educação, como as altas taxas de inclusão.
Matrículas: O Brasil possui 47 milhões de matrículas na educação básica e 2,3 milhões de docentes, representando uma população escolar maior do que a de muitos países, como a Espanha.
Universalização: Em 2024, o percentual de matrícula para os anos finais do ensino fundamental atingiu 97,6% (jovens de 11 a 14 anos). O ensino médio chegou a 82,8% dos jovens de 15 a 17 anos.
No entanto, ele questiona o que falta na educação: financiamento, reconhecimento da diversidade e valorização da carreira docente. Ele critica a desprofissionalização da carreira docente, ressaltando que 49% dos docentes das redes estaduais têm contratos temporários, o que dificulta a construção de uma unidade escolar sólida.
Como ferramenta de combate à herança de classe, ele cita o sucesso das políticas afirmativas no ensino superior, que permitiram que jovens negros e pobres entrassem na universidade pública, melhorando significativamente o debate nacional.