Os Estados Unidos iniciaram, nesta terça-feira (15), uma investigação interna sobre supostas práticas comerciais “desleais” do Brasil. Entre as preocupações levantadas pelo representante de Comércio dos EUA, Jamieson Greer, no documento intitulado “Investigação da Seção 301 sobre Práticas Comerciais Desleais no Brasil”, está o sistema de pagamento brasileiro, o Pix. Embora não haja uma menção direta, o texto cita “serviços de pagamento eletrônico do governo”, afirmando que “o Brasil também parece se envolver em uma série de práticas desleais com relação a serviços de pagamento eletrônico, incluindo, entre outras, a vantagem de seus serviços de pagamento eletrônico desenvolvidos pelo governo”.
Concorrência com Gigantes Tecnológicos
Uma das principais especulações para a crítica americana é a rivalidade do Pix com o WhatsApp Pay e outras bandeiras de cartão de crédito norte-americanas. Em junho de 2020, o WhatsApp, da Meta (empresa de Mark Zuckerberg, aliado de Donald Trump), anunciou que o Brasil seria o primeiro país a receber sua funcionalidade de envio e recebimento de dinheiro. No entanto, uma semana depois, o Banco Central (BC) e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) suspenderam a função.
A economista Cristina Helena Mello, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), defende a decisão do BC, explicando que o WhatsApp estava operando fora do sistema financeiro legal brasileiro e sem integração com ele. Isso, segundo ela, “escapava da regulação do Banco Central, o que fere regras brasileiras de acompanhamento de transações monetárias”.
O Pix foi lançado oficialmente em 16 de novembro de 2020, mas seu desenvolvimento pelo Banco Central começou em maio de 2018, com o objetivo de criar um sistema “eficiente, competitivo, seguro, inclusivo” e neutro em relação a modelos de negócio específicos.
Pix como Alternativa ao Dólar e ao Cartão de Crédito
Outro ponto que pode incomodar o governo norte-americano é o crescimento do Pix como uma alternativa ao dólar em algumas transações internacionais envolvendo brasileiros. A economista Cristina Helena Mello aponta que países como Paraguai e Panamá já aceitam pagamentos via Pix em alguns comércios, com comerciantes abrindo contas no Brasil para receber os valores. Essa prática, que antes passava pelo dólar, é vista como prejudicial ao interesse de controle norte-americano, pois “quanto menor a demanda por uma moeda, menos ela vale”.
Além disso, as operadoras de cartão de crédito dos EUA podem se sentir ameaçadas pelo lançamento do “Pix Parcelado”, previsto para setembro de 2025. Essa nova funcionalidade permitirá que os usuários brasileiros parcelem transações de forma similar ao cartão de crédito, enquanto o recebedor continua recebendo o valor total instantaneamente.
Defesa do Pix: Eficácia e Inclusão
Apesar das críticas e motivações americanas, Cristina Helena Mello defende o Pix como um sistema de pagamento eficaz e inclusivo. Em 2024, o Pix movimentou R$ 26,4 trilhões, segundo dados do Banco Central.
A economista enfatiza que o Pix “permitiu que uma série de pessoas de menor renda tivesse acesso a uma forma de transação monetária barata”. Ela ressalta que o sistema “é ágil, promoveu um processo de bancarização, de inclusão de pessoas que não tinham conta. E faz parte da lei de competência e de concorrência oferecer um produto cada vez melhor”.