De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o glaucoma é responsável por 5% dos casos de cegueira em crianças em todo o globo. Isso significa que de 1,5 milhão de crianças de 0 a 7 anos de idade, 75 mil ficaram cegas devido à doença.
“A população, os pediatras, são nosso público-alvo da live, porque são as primeiras pessoas que têm contato com a criança com suspeita de glaucoma infantil que dá sintomas”, disse nesta terça-feira (15) à Agência Brasil a oftalmologista Hévila Rolim, professora de oftalmologia da Universidade Federal de Rondônia (Unir) e coordenadora do setor de Glaucoma Pediátrico da SBG. Hévila é uma das autoras da cartilha, ao lado de Ana Flávia Belfort e Regina Cele Silveira Seixas, também coordenadoras do setor de Glaucoma Pediátrico da entidade.
Tipos
O tipo mais comum da doença é o glaucoma congênito. “A criança nasce já com sinais, ou desenvolve nos dois primeiros anos de vida. Pais e pediatras que têm o primeiro contato precisam reconhecer os sinais para que um especialista seja procurado”, indicou Hévila. Na criança, o glaucoma não costuma ser silencioso, como ocorre com o adulto.
No principal subtipo, que é o glaucoma congênito primário, o aumento da pressão do olho leva, na criança em desenvolvimento, ao crescimento do tamanho do olho. “A córnea fica opaca, a criança fica com o olho grande, às vezes o olho cresce de um tamanho diferente do outro, a criança tem lacrimejamento, sensibilidade à luz muito importante. É um olho diferente do olho de um bebê ou de uma criança de 2 anos normal”, informou a oftalmologista.
Há outros tipos de glaucoma infantil, como o congênito secundário, que pode surgir em decorrência de cirurgia de catarata congênita, do uso de corticoides por longos períodos, de trauma ocular e de outras malformações do olho. Hévila Rolim esclareceu que até os 4 anos de idade, o olho da criança está mais maleável, em crescimento. “Esse olho se distende com o aumento da pressão ocular e muda o formato. Por isso, surgem alterações, como o olho ficar grande, a córnea ficar opaca”. Depois dessa faixa etária, o glaucoma pode vir a ser silencioso. Daí, ser importante a consulta regular com um oftalmologista para que a doença possa ser identificada.
A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) recomenda que a criança sem nenhum fator de risco realize, em primeiro lugar, o Teste do Olhinho ainda na maternidade e, depois, a primeira consulta com um oftalmologista entre 6 meses e um ano de vida. “Mas toda criança deve passar por uma consulta de rotina com oftalmologista entre 3 anos e 5 anos”, insistiu a especialista.
Tratamento
Para o principal tipo do glaucoma infantil, que é o glaucoma congênito primário, o tratamento é essencialmente cirúrgico, diferente do adulto, em que o tratamento principal começa com colírio. Na criança, ele pode ser usado até a cirurgia ou como um adjunto ao tratamento cirúrgico. Como a doença é causada por uma má formação, o olho produz diariamente um líquido que todo dia é escoado, no sistema de drenagem do olho. “No glaucoma congênito, esse sistema de drenagem é mal formado e isso leva ao aumento da pressão ocular”. No glaucoma congênito, o objetivo da cirurgia é restaurar o escoamento desse líquido, para restaurar a pressão intraocular”. “É esse glaucoma que assombra a gente, porque ele cega”.
Hévila esclareceu que mesmo com a cirurgia, os médicos podem normalizar a pressão, mas não conseguem fazer o olho reduzir de tamanho, ou seja, não conseguem restaurar a anatomia do olho. “Essa é a preocupação da gente, porque isso leva ao glaucoma infantil que é a principal causa de cegueira entre crianças”. Advertiu que mesmo fazendo a cirurgia, muitas crianças vão apresentar alguma deficiência porque, na maior parte das vezes, o paciente não chega aos especialistas em estágio inicial. “Já chega com glaucoma avançado”. Por isso, a SBG está lançado a cartilha para que o diagnóstico seja feito o mais precocemente possível, para que a criança possa ser referenciada a um oftalmologista capacitado a operá-la e normalizar a pressão intraocular. O diagnóstico tem que ser precoce para evitar a deficiência visual, reiterou. Nos outros tipos da doença, o tratamento pode ser cirúrgico ou clínico.
As três personagens da cartilha visam sensibilizar e aproximar as pessoas, falando sobre quais são as funções de cada parte do olho, como o olho funciona, quais são os sinais e sintomas do glaucoma infantil, como é feito o diagnóstico, como é o tratamento, quais são as recomendações de exames para uma criança saudável. “Está um material acessível para a população”.
Rede de referências
A SBG está participando, em conjunto com o Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO) e a Sociedade Brasileira de Oftalmopediatria (SBOP), do processo de criação de uma rede de referenciamento no Sistema Único de Saúde (SUS) das principais doenças infantis que levam à cegueira. A ideia é que o glaucoma infantil seja incluído nessa rede, para que os pacientes cheguem mais cedo nos médicos, e a cirurgia e o tratamento possam ser realizados, evitando-se a evolução do quadro para deficiência visual ou para cegueira. “É para minimizar as consequências dessa doença e preservar a visão. E, também reabilitar, porque a cirurgia não resolve e aquela criança vai ser acompanhada a vida inteira. Então, essa criança precisa estar em um centro de excelência”, destacou Hévila Rolim.
Até o momento, mais de 45 locais já foram mapeados para atendimento ao glaucoma infantil, mas nem todos estão totalmente estruturados, com profissionais especializados, materiais, centros cirúrgicos inclusive para fazer exames com sedação, reabilitação, suporte psicológico para os pais. Na avaliação da coordenadora do setor de Glaucoma Pediátrico da SBG, é preciso que toda essa rede seja estruturada, para dar o devido suporte às crianças com glaucoma.