No próximo domingo, segundo fim de semana de maio, milhares de pessoas celebrarão o Dia das Mães. A data que movimenta o comércio e alegra o almoço em família, também acende memórias e intensifica feridas causadas pela ausência das mães que não estão mais aqui.
Aprendi isso da pior forma. Este será o meu primeiro Dia das Mães sem a minha mãe e também o de milhares de brasileiros, filhos de mulheres vítimas do feminicídio. A diferença está na causa do óbito de nossas mães. A minha faleceu após uma cirurgia cardíaca. Já os órfãos do feminicídio tiveram o direito de suas mães viverem cruelmente retirados.
Fazer parte do grupo dos que perderam a mãe é profundamente doloroso. A gente fica sem rumo, sem compreensão, neste lugar chamado Terra. É a ruptura de uma ligação única, a perda de uma figura fundamental em nossas vidas. É como se o mundo perdesse o cheiro de casa. É se enxergar sem amparo, pois o nosso colo sagrado não está mais aqui. É o fim da infância emocional. É entender que, a partir de agora, é você por você.
Se essa dor, que vem e vai, lateja desse jeito em quem já tem o córtex pré-frontal formado, em crianças ela é intensamente traumática, pois afeta diretamente o desenvolvimento emocional e social de quem ainda está começando a viver. A violência contra a mulher gera consequências que atingem seus familiares. As chamadas vítimas indiretas são crianças, adolescentes, jovens e adultos que convivem com a violência em seus próprios lares.
A perda abrupta da mãe e o fim do poder familiar do genitor, em virtude da autoria do crime, provocam uma mudança drástica na vida dos pequenos. Quando os parentes acolhem as vítimas, os órfãos do feminicídio muitas vezes mudam de residência ou escola, perdendo os vínculos familiares e sociais já construídos. Algumas vezes, os irmãos são separados, diante da impossibilidade de acolhimento familiar. E, não havendo acolhimento por parte dos familiares, por questões financeiras, essas crianças são enviadas a abrigos, onde são tachadas como “sem vínculo familiar”.
Além dos traumas causados pelo feminicídio, os impactos alteram o padrão de vida de crianças e adolescentes. Sem o suporte econômico dos pais, os órfãos passam a viver por conta da própria sorte. Essas vítimas indiretas do machismo estrutural precisam ser retiradas da invisibilidade o quanto antes. O suporte emocional e econômico é fundamental para uma existência digna durante o desenvolvimento do indivíduo.
O Estado deve proteger crianças e adolescentes diante desse problema de saúde pública. E, antes disso, ajudar a prevenir tragédias anunciadas em lares brasileiros. A implantação de leis mais severas e a proteção às mulheres vítimas de violência previnem problemas futuros e ajudam crianças a viverem ao lado de quem lhes oferece proteção e amor.
Perder a mãe é divagar entre lembranças dela, a vida que ela viveu, os sonhos que deixou de realizar e a culpa por não tê-la aproveitado mais. Neste Dia das Mães, deixo todo o meu apoio aos órfãos de casos de feminicídio. Dizem que essa dor encontra um lugar dentro da gente e que o tempo ameniza tudo. Mas nós, agora órfãos, sabemos que a saudade delas será eterna, e que o seu amor gigantesco, que transcende qualquer limite, jamais será substituído.