A magnitude das águas está internalizada nos devaneios da alma ribeirinha. Ela corre de forma desmesurada e transcendental, abraçando e protegendo os palcos florestais do ecoequilíbrio encantatório e divinizado das coletividades humanas da Amazônia brasileira.
Para Gaston Bachelard – filósofo francês de Bar-sur-Aube – a água nos aparece como um ser total: tem um corpo, uma alma, uma voz. E mais que nenhum outro elemento talvez, a água é uma realidade poética completa. Para Bachelard, uma poética da água, apesar da variedade de seus espetáculos, ela tem a garantia de uma unidade, e que a água deve sugerir ao poeta uma obrigação nova: a unidade de elemento.
Segundo o geógrafo francês, Eric Dardel, o domínio das águas é inseparável do espaço verde e está do lado da vida. Para ele, o espaço aquático é um espaço líquido, torrente, riacho ou rio, que corre e coloca o espaço em movimento. Dardel nos diz que o rio é uma substância que rasteja e que serpenteia. O mesmo autor nos revela que as águas deslizam através do frescor dos bosques espessos e docemente agitados.
A marca de um encontro poetizante
De águas amazônicas divinizadas
De águas escuras e águas amareladas
Faz surgir um cenário exuberante
Num estado de alma devaneante
O seringueiro medita no batelão
No silêncio de sua imaginação
Ele sente o espírito da natureza
Vê nos rios, sua inefável grandeza
Incorporado de peculiar cosmovisão.
A exuberância cósmica dos rios, alimenta o ser de suas coletividades, promove os devaneios de suas encantarias, exalta de forma inebriante a sua benevolente simbologia, cria e recria de maneira heterotópica os ritos e mitos ancestrais de suas populações, e cotidianamente renova a poética estetizante das águas.