Sobre os marcadores percepto visual-sensoriais, o escritor e geógrafo Adnilson de Almeida Silva, nos diz que eles possuem estreitas relações com os marcadores simbólicos e que ainda estão assentados numa construção psíquico-espiritual dos coletivos humanos, pois, no seu contexto, funda-se na materialidade, na imaterialidade e no inatingível, como se constata nos odores, sons e ruídos, seres vivos intangíveis e no imaginário criado através de sonhos, intuições e premonições. O autor nos diz ainda que esses marcadores podem também ser inseridos no sentido sensorial ou naquilo que muitos consideram como sexto sentido.
Os dois amigos concordaram em fazer a extração do látex durante a noite, mas quando chegou num certo momento, a natureza se revoltou e fez com que Manoel tivesse que passar por uma situação nada agradável, conforme ele mesmo narra:
“Eu trabalhava com um companheiro chamado José Freijó, morava na colocação Recanto, José Freijó, só cortava seringa de manhã. Um dia de sábado, falei para meu companheiro, para irmos cortar a noite, ele falou que não, depois mudou de ideia e me pediu para chama-lo quando eu fosse sair. Quando a noite caiu, fomos dormir, na hora de sair, me levantei, fiz o café, arrumei as minhas coisas: balde, saco, facão e a marmita com comida, coloquei tudo dentro de um paneiro e chamei o companheiro. Ele arrumou suas coisas também e saímos, eu para a estrada do centro e ele para a estrada de ponta. Quando cheguei na boca da estrada, coloquei as minhas coisas no galho da árvore, peguei a faca de seringa e sai cortando, quando estava com umas quarenta madeiras de seringa cortadas, começou um temporal, só que estávamos no mês de julho, que não é mês de chuva, então fiquei nervoso com aquele temporal que vinha quebrando tudo, logo aquele vento parou de vez, eu estava perto de um igarapé, que tinha bastante água, quando escutei uma lapada na água dizer “de macaco já virou peixe”, as lapadas viraram pisadas que vinham em minha direção. Eu tentava ver, mas não via nada de vulto, tirei a Poronga para tentar ver, mas não adiantou, as pisadas continuavam a se aproximar de mim, quando estava com um metro, fiquei suspenso do chão, sem nada na cabeça, me tremendo todo. Pensei em voltar para casa, mas não voltei, continuei a cortar seringa, quando voltei colhendo a seringa, cheguei ao local, tentei achar algum vestígio de alguma coisa, se era bicho ou outra coisa, mas não achei nada, voltei para casa e dei o nome de assombração para esta estrada e não voltei mais a cortar seringa nela, que ficou abandonada. Contei para meu companheiro José Freijó, que me falou que era por isso que não cortava seringa a noite, que a noite é dos bichos e das visões, das assombrações”.
Segundo Almeida Silva, as representações simbólicas e espirituais do espaço de ação, constituem importantes marcadores estruturantes que fazem parte das vivências e da organização territorial de suas coletividades. O mesmo autor nos esclarece ainda que a narrativa anterior demonstra que em seu universo cosmogônico, a natureza é um conjunto interconectado, indissociável do divíduo e precisa ser respeitado, porque é nela que encontra o abrigo necessário para a permanência do modo de vida.
A ideia de pertencimento ao lugar, os reflexos da imaterialidade presentes no imaginário do seringueiro, e as percepções oriundas de seus saberes e fazeres, resultam no surgimento da essência do ser desse ente como bem demonstrado nas assombrações dos seringais amazônicos.