Apesar da absurdez humana de dominação e exploração nos antigos seringais amazônicos, os seringueiros jamais se renderam à tamanha repulsa e execração ao outro. Eles sempre resistiram de forma obstinada a essa danosa abominação de antipatia no contexto histórico de suas relações sociais.
Na estesia e deslumbramento dos seus tradicionais modos de vida, os seringueiros levantavam-se pela madrugada e saiam para cortar a estrada de seringa: sangravam as seringueiras e embutiam as tigelinhas para aparar o precioso látex.
Depois de recolher as tigelinhas, chegava a hora de acender o buião para realizar a tão esperada defumação do látex. Conforme nos informa o escritor Raimundo Ferreira, o buião consistia numa armação redonda, erguida em barro na vertical, com a base mais larga e situada sobre uma escavação no chão, onde se acende o fogo alimentado com lascas de madeiras, que produz fumaça por um orifício situado na parte superior.
É defumando o látex e banhando a borracha com seus movimentos giratórios até atingir o efeito da coagulação, que surge a tão sonhada “péla”: a borracha natural em formato de bola.
O embelecido seringal amazônico – no seu colossal mundo fenomenológico – também possui seu exuberante poder mítico transcendental, pois quem cheirou a devaneante fumaça do buião, jamais irá esquecê-lo.
Marquelino Santana é doutor em geografia, pesquisador do Grupo de Estudos e Pesquisas, Modos de Vida e Culturas Amazônicas – Gepcultura/Unir e pesquisador do grupo de pesquisa Geografia Política, Território, Poder e Conflito da Universidade Estadual de Londrina.