Autor: Marquelino Santana
Depois de percorridos aproximadamente 195 km da sua nascente, o rio Abunã receberá as águas escuras de mais um importante afluente: o rio Mamu. O encontro dessas águas e o encantamento da floresta banhada por onde se estende as águas do Mamu, carregam no seu bojo uma notável história de colonização ocorrida durante os dois grandes ciclos da borracha da Amazônia e que de forma brilhante resiste até hoje aos avanços avassaladores da era da globalização, preservando uma rica biodiversidade existente nos seringais nativos da região pandina boliviana.
A presença do homem seringueiro nos seringais do rio Mamu tem, portanto, um longo percurso histórico de luta e sobrevivência que demonstra importante relação entre o homem e a natureza e sua relevante posição fisiográfica e humana no heterogêneo mundo amazônico.
A floresta brasiviana tem no encontro dessas águas uma importante marca que contribui na formação identitária dos homens seringueiros. A floresta possui um majestoso espaço cosmogônico munido de presentificações e representações simbólicas edificadas pelo imaginário humano ribeirinho.
A foz do rio Mamu brilha diante de um magnífico encontro de águas que brincam com suas cores liquidas. Águas amareladas e negras se encontram, se misturam, se abraçam e constituem uma tonalidade negro amarelada que provoca e promove o surgimento peculiar, prazeroso e sublime de um momento majestoso da natureza na fronteira Brasil/Bolívia.
As cores que brotam deste encontro maravilhoso de águas são também observadas em silêncio pela cor verdejante da deslumbrante mata de suas margens. Após o encontro das águas, as águas do rio Mamu mudam de cor e tornam-se mais claras num tom quase azul-verdejante.
As águas na sua estetizante e colossal benevolência nos ensinam a tolerar as diferentes diferenças, a conviver com generosidade e complacência e a sonhar nessa inenarrável volúpia da natureza fronteiriça com um mundo mais justo para todos.
Marquelino Santana é doutor em geografia, pesquisador do Grupo de Estudos e Pesquisas, Modos de Vida e Culturas Amazônicas – Gepcultura/Unir e pesquisador do grupo de pesquisa Geografia Política, Território, Poder e Conflito da Universidade Estadual de Londrina.