A fronteira da aversão não é mais beligerante. A voz de um comando insolente e grosseiro com as populações ribeirinhas agora descansa solitária e subserviente ao ilícito fronteiriço. Os seringueiros brasivianos eram os verdadeiros guardiões de uma fronteira binacional concatenada ao bem viver e à clarividência internacional dos direitos humanos.
A austeridade fiscal perdeu a sua coesão e o seu encadeamento constitucional. No conciliábulo dos corrilhos silenciosos os valores pandinos e benianos estão sendo asfixiados num conúbio deflagrado com demais embusteiros estrangeiros.
Nos confins de um degredo sombrio, a sociedade atônita pede socorro. Em ruina e no descalabro de suas virtudes, as comunidades fronteiriças estão sendo encurraladas e esmaecidas pela empáfia e embrutecimento dos malfeitores.
A passagem está livre, o ronco dos batelões foi asfixiado, a fronteira está despovoada e as negociatas espúrias são acobertadas por quem deveria atuar em defesa da sociedade.
O discurso evasivo e exacerbado dos delinquentes aplaudiu a desterritorialização das populações ribeirinhas do rio Mamu. A nefasta rota fluvial se fortalece com a demanda de atos burlescos que fragiliza a soberania binacional e fere profundamente a pureza do bem viver.
A patriotice perniciosa e nefasta, persegue e afronta a soberania ética e triunfante. A sociedade em estado de resignação teme a desforra do réprobo e se cala diante da lei da mordaça.
GEPCULTURA – FUERZA NAVAL BOLIVIANA – 3º DISTRITO NAVAL MADERA – CAPITANIA DE PUERTO MANU – RIO MAMU – PANDO – BOLÍVIA. 2010
No impropério das águas em remanso e sem os seus tradicionais ribeirinhos, o rio Mamu inebriante declarou sinal de luto. Visivelmente lúgubres, os ribeiros pararam de alimentar o Mamu. O Mamu parou de alimentar o Abunã e o Abunã parou de alimentar o Madeira.
No infortúnio de tristeza e nostalgia, este pesquisador parou de navegar e aposentou o seu batelão. As bibliotecas humanas partiram e a territorialidade seringueira secou o seu leite.
O que mais tenho a oferecer ao Gepcultura senão as crônicas fúnebres de um imaginário em desmoronamento? Quem me observa passar não observa o meu ser e nem sente o aniquilamento de uma alma em cativeiro.
GEPCULTURA – FUERZA NAVAL BOLIVIANA – 3º DISTRITO NAVAL MADERA – CAPITANIA DE PUERTO MANU – RIO MAMU – PANDO – BOLÍVIA. 2015
A ruptura do ser com o lugar é uma ruina tórrida que arde na alma. Os brasivianos partiram e levaram os clarões da poronga. Navego apenas para lembrar segurando o corpo gelado da flor do Mamu em meus braços. Esta parte eu preservei no meu ser e não escrevi nas lutuosas linhas de uma tese órfã. Elas só aumentariam a minha dor. Peço desculpas ao rabino rondoniense que me orientou com a pureza de sua alma e que me ensinou navegar nas almas briosas do Mamu.
A estesia da mata se exauriu completamente. A fácula se despediu do sol e da lua e morreu. Uma mácula xenófoba imbricou-se numa bandeira fronteiriça e aos poucos vai apagando as diferentes diferenças dos modos de vida das coletividades originárias e tradicionais da Pan – Amazônia Sul Ocidental brasileira e boliviana.
A mátria brasiviana nos ensinou os caminhos fulgentes do bem viver, enquanto duas pátrias não tiveram a decência de alojá-la com dignidade no colo de suas bandeiras.
GEPCULTURA – FUERZA NAVAL BOLIVIANA – 3º DISTRITO NAVAL MADERA – CAPITANIA DE PUERTO MANU – RIO MAMU – PANDO – BOLÍVIA. 2015
Por enquanto prefiro não me estender no debate do nacionalismo, a fenomenologia me ensinou a compreender as suas virtudes e as suas fraquezas. Quando as vozes da floresta são impiedosamente caladas pela ganância tenebrosa da cobiça, as coletividades tradicionais amazônicas são violentamente forçadas à perderem seus elementos identitários do ser.
Desta forma há também um visível menosprezo e alijamento das culturas originárias, caboclas, quilombolas e ribeirinhas pelas políticas estatais desenvolvimentistas da Amazônia.
GEPCULTURA – FUERZA NAVAL BOLIVIANA – 3º DISTRITO NAVAL MADERA – CAPITANIA DE PUERTO MANU – RIO MAMU – PANDO – BOLÍVIA. 2015
Sem a presença das populações tradicionais ribeirinhas, os rios amazônicos estão se tornando um verdadeiro refúgio de delinquentes. Um verdadeiro descalabro está sendo montado às margens desses rios, enquanto os poucos guardiões que ainda restam são cotidianamente assediados por míseras espórtulas da vida.
Orquestraram um verdadeiro enclausuramento aos brasivianos, mas eles resistiram e estão se adequando à novos modos de vida no Assentamento Wálter Arce no Estado do Acre.
O embuste das políticas desenvolvimentistas de fronteira, desterritorializa e encurrala os povos originários e tradicionais da floresta. A empáfia asfixia a empatia e os engodos nacionais e internacionais conduz as sociedades ao escárnio.
Alguns dirigentes de Estado sem escrúpulo e dotados de padrões morais esdrúxulos são costumeiramente silenciados pela força manipuladora do capital, enquanto deveriam combater constitucionalmente a ilicitude horripilante de fronteira que se escamoteia no incauto e na incúria de uma insidiosa cortina de silêncio.
Marquelino Santana é doutor em geografia, líder do Grupo de Estudos e Pesquisas, Modos de Vida e Culturas Amazônicas – Gepcultura/Unir e pesquisador do grupo de pesquisa Percival Farquhar o maior empresário do Brasil: Territórios, Redes e Conflitos na Implantação da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré (EFMM-RO) e na Estrada de Ferro São Paulo-Rio Grande (EFSPRG-PR/SC), da Universidade Estadual de Londrina e do grupo de pesquisa Geografia Política, Território, Poder e Conflito, também da Universidade Estadual de Londrina.