Um dia após o presidente Donald Trump usar uma máscara em público pela primeira vez, a Flórida registrou mais de 15.300 novos casos da Covid-19 em 24 horas neste domingo, mais do que qualquer outro estado americano desde que a pandemia começou. Em meio ao acelerado processo de retomada da economia, tal qual defende a Casa Branca, o aumento dos contágios é reflexo do fracasso dos Estados Unidos na contenção da crise sanitária.
Se a Flórida fosse um país, ficaria em quarto lugar no mundo em número de novos casos jamais registrados em só um dia, sendo suplantada nesse quesito apenas pelos EUA como um todo, o Brasil e a Índia. No total, segundo o levantamento do New York Times, o estado registra 269.800 diagnósticos de Covid-19, com 4.200 mortes. Em todos os EUA, já são mais de 3,2 milhões de casos, com 135 mil mortes.
No sábado, os parques da Walt Disney World, fechados desde março, iniciaram sua reabertura: o Magic Kingdom e o Animal Kingdom abriram suas portas, enquanto o Epcot e o Disney’s Hollywood Studios voltarão a funcionar no dia 15. O condado de Orlando, onde o complexo está localizado, foi um dos que registraram recordes de casos neste domingo.
No início, era Nova York que registrava o maior número de casos diários no país. No dia 10 de abril, quando era epicentro da pandemia nos EUA, o estado contabilizou seu recorde de 12.847 diagnósticos. A testagem na Flórida, no entanto, bateu recorde neste domingo, com 143 mil resultados, mais que o dobro da média de 68 mil registrada na última semana. Isso é uma das explicações para o fato de a taxa de mortalidade ser bastante inferior à nova-iorquina há três meses.
– No final das contas, mais pessoas estão se locomovendo e não estão necessariamente tomando as precauções que nós acreditamos que ajudariam — disse Marissa Levine, professora na Faculdade de Saúde Pública da Universidade do Sul da Flórida. Segundo ela, os novos casos são majoritariamente registrados em pessoas jovens, o que também contribui para as taxas mais amenas de letalidade.
Apesar da gravidade da situação, o governador da Flórida, o republicano Ron DeSantis, impulsiona o estado a retomar as atividades. Sob críticas de líderes locais, ele recomendou que as escolas voltem a funcionar cinco dias por semana, como Trump pressiona o país inteiro a fazer. Parques temáticos concorrentes da Disney, como o Universal Orlando e o SeaWorld Orlando, reabriram há semanas, assim como academias e restaurantes.
A Flórida é considerada um estado-chave para as eleições de novembro e foi fundamental para que Trump conseguisse se eleger em 2016, quando obteve uma vantagem de 1,2% dos votos sobre Hillary Clinton no estado. No entanto, de momento, quem lidera no estado é o democrata Joe Biden, que tem 48% das intenções de voto, contra 42,8% de Trump, segundo a média das pesquisas feita pelo site Real Clear Politics.
Importância eleitoral
Nas últimas 10 eleições, republicanos ganharam na Flórida sete vezes e democratas, três. Em nove dos dez pleitos, o candidato vitorioso no estado elegeu-se presidente — a exceção foi George H. W. Bush, em 1992. A importância do local é tamanha que os republicanos escolheram a cidade de Jacksonville para ser palco de sua convenção, marcada para ocorrer entre 24 e 27 de agosto.
Trump também se vê atrás de Biden nas pesquisas nacionais: tem 40,3% dos votos, contra 49,3% de Biden, segundo a média do Real Clear Politics. Mal avaliado na gestão da pandemia, o presidente vinha sendo pressionado pelos próprios republicanos a aparecer publicamente de máscara, proteção que nos EUA virou peça da polarização política, com conservadores alegando que tornar seu uso obrigatório viola as liberdades individuais.
Ao mesmo tempo, o presidente desafia as diretrizes da Organização Mundial da Saúde e da comunidade científica para o isolamento social e demanda uma retomada rápida das atividades em todos os setores.
Trinta e sete dos 50 estados americanos veem um aumento dos casos de Covid-19 e, apenas no sábado, foram registrados mais de 60 mil novos diagnósticos da doença no país. Na sexta, os novos diagnósticos ultrapassaram 68 mil, criando um novo recorde diário pela sétima vez em onze dias.
Em diversos estados, incluindo a Flórida e Michigan, manifestantes contrários ao uso de máscaras organizaram protestos contra governos locais. O uso de máscaras nos Estados Unidos acabou se tornando uma disputa política entre apoiadores do presidente, que se recusam a colocar o acessório alegando tratar-se de uma violação inaceitável da liberdade individual, e aqueles que consideram a medida fundamental para evitar o avanço da pandemia.
Neste domingo, a secretária de Educação de Trump, Betsy DeVos, disse que o governo está estudando "todas as opções" para cortar o financiamento dos distritos escolares que não reabrirem no verão, algo que o presidente já havia ameaçado fazer no início da semana. A maior parte do orçamento escolar vem de impostos locais e de fundos alocados pelo Congresso, mas os auxílios emergenciais da Casa Branca são considerados essenciais para que os centros de ensino se adequem às exigências do Centro de Controle e Prevenção de Doenças, também criticadas por Trump.